terça-feira, 31 de maio de 2022

PESQUISAS ELEITORAIS E A IMPRESSÃO DO VOTO

                                                                                       



 

 Barros Alves

 Por primeiro, antes de adentrar no tema subordinado ao título em epígrafe, recolhido em obra de autoria do ilustre advogado Djalma Pinto, eleitoralista reconhecido pela competência e ética no exercício do múnus profissional, urge afirmar que a Justiça Eleitoral no Brasil foi criada em fevereiro de 1932, como um fruto da Revolução de 30,  que pavimentou o caminho para a ditadura estadonovista liderada por Getúlio Vargas no País. Daquele tempo a esta parte transformou-se num monstrengo por demais pesado aos cofres públicos e que, parasitariamente, obriga-nos a cevar um Tribunal Superior Eleitoral instalado num palácio que mais parece um Olimpo, onde habitam semideuses a ditar regras a torto e a direito, muitas delas sem eira nem beira, concomitantes com a legislação regular. Além do elefante branco que abriga os maiorais da Justiça eleitoral em Brasília, o suor do povo brasileiro é sugado por mais vinte e sete Tribunais Regionais Eleitorais, mais de 2,8 mil juízes e juízas e 15,4 mil servidores e servidoras. Na verdade, uma “Justiça” que é um penduricalho completamente dispensável.

A Consultoria Legislativa do Senado Federal elaborou amplo e importante estudo no qual pesquisou o funcionamento dos processos eleitorais em vários países do Planeta. Tal estudo denominado “Funcionamento da Justiça Eleitoral em alguns Países” mostrou ser “comum se deixar a operação das eleições com o próprio Poder Executivo nacional (como na Finlândia e na Argentina) ou municipal (como nos EUA, França e Alemanha). Mas em alguns países (como Chile e Uruguai) a administração das eleições fica a cargo de órgãos autônomos, não integrantes de nenhum dos Poderes tradicionais. Já o Poder Judiciário nas eleições tanto pode ficar a cargo da Justiça Comum (como EUA e Itália) como ser de responsabilidade de Cortes especializadas”.

No caso brasileiro, a Justiça Eleitoral ganhou foros de onipotência não observada em nenhum país do planeta. E além desse poder extraordinário sem uma justificativa convincente para tal, a situação nababesca proporcionada aos juízes dessas Cortes é algo agressivo a uma sociedade que ainda patina em inconcebíveis desníveis sócio-econômicos. Enfim, não se tem notícia de que haja tão imensos gastos com um braço judiciário especializado em lugar nenhum do planeta. Uma farra!!! O próprio Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal-STF, e que já presidiu o TSE, ao analisar as atribuições exageradas da Justiça Eleitoral brasileira, afirmou ser “um exemplo único no mundo”.  Esqueceu de complementar: trata-se, no Brasil, de um mau exemplo que deveria ser extirpado. Dessa necessidade o povo brasileiro está tendo plena consciência nos dias que correm, tais os desvios que temos observado no âmbito da Corte superior encarregada de zelar pela lisura dos pleitos eleitorais.

Dito isto, vejamos o que escreve o advogado Djalma Pinto, uma das muitas e abalizadas vozes que tecem críticas ao sistema eleitoral em razão dos seus notórios descaminhos. Em 2016, o eminente causídico fez publicar um livro com irretorquíveis questionamentos sobre “As Inovações na Lei Eleitoral e a Ilusão da Ficha Limpa”. Com título sintomático da ambientação político-eleitoral do Brasil, cujo ordenamento jurídico facilita sobremodo a ação nefasta de governantes desonestos, o livro constitui um repositório de constatações e previsões sobre a inocuidade da lei, previsões que, diga-se de passagem, se tornaram realidade nos pleitos subsequentes.

Neste ano de 2022, tendo como base um estudo de caso em eleição ocorrida em 2012, em que pesquisas eleitorais claramente contribuíram para a derrota de um candidato que tinha amplas possibilidades de vitória na disputa pela prefeitura de Fortaleza, o jurista Djalma Pinto escreveu o livro “Pesquisas Eleitorais e a Impressão do Voto.” Arrimado em dados, fatos e rica bibliografia sobre o tema, o autor conceitua, comenta, contesta, analisa e, sobretudo, denuncia os descalabros causados por pesquisas eleitorais erradas e/ou possivelmente fraudulentas. Esses erros e/ou fraudes ocorrem às barbas da Justiça Eleitoral, sem que nenhuma atitude rigorosa de punição seja adotada com a pressurosidade requerida à autoridade judiciária eleitoral. Na teoria legal a lei eleitoral pune a pesquisa fraudulenta, qualificando-a como crime, lembra Djalma Pinto, acrescentando: “Pune, por igual, a pesquisa não registrada nos cinco dias anteriores à sua divulgação. Não haverá, então, punição para as pesquisas erradas, quando registradas na Justiça Eleitoral?” Erradas ou objetivamente fraudulentas, o que se tem visto é um abuso cometido com grande desfaçatez por Institutos de Pesquisas que vão ajustando-as de acordo com o andar da carruagem, como ocorreu na eleição de 2018. No dia 28 de fevereiro daquele ano, ou seja, seis dias antes do pleito, as pesquisas insistiam em divulgar que Jair Bolsonaro perderia pra todos os demais candidatos à presidência da República. O que se viu foi a desmoralização dessas pesquisas. E onde está a poderosa Justiça Eleitoral que pouco ou nada faz para coibir tais abusos? Djalma Pinto observa com propriedade: “A sensação dominante na sociedade é de que os institutos de pesquisa estão fora do alcance da legislação que pune o erro cometido no exercício de qualquer atividade profissional. O registro da pesquisa, na Justiça Eleitoral, passa a falsa impressão de que seus executores não estão sujeitos à sanção ou quaisquer falhas cometidas ou praticadas. Todavia, estão sim!” Com efeito, o Código Civil assim o determina em seu artigo 927.

Quanto ao outro tema abordado no livro, qual seja a impressão do voto, tal constitui exigência de grande parcela dos eleitores brasileiros, para a qual o Tribunal Superior Eleitoral faz ouvido de mercador. Pior: alguns ministros da Corte acumpliciados com o silêncio dos demais, silêncio ditado por um contraproducente espírito de corpo, investem contra quem quer que seja que duvide da inviolabilidade do sistema eletrônico. Ora, não existe em lugar nenhum do mundo nem em nenhuma situação, sistema algum inviolável. No caso do sistema eleitoral brasileiro, um dos ministros que são contrários ao voto impresso, já o disse claramente. O ministro Fachin, atual presidente do TSE, notoriamente militante contrário à adoção do voto impresso, dobrou a própria língua ao afirmar que a Justiça Eleitoral estava sob ataque de hackers russos. A declaração do ministro comporta dois lados gravíssimos: no primeiro, se verdadeira a denúncia feita pelo ministro em tom de alarme, fica claro que o sistema não é inviolável; no segundo lado da moeda, em sendo uma fala que careça de substância, o ministro estaria mentindo e fica deveras feio e antiético a mentira na boca de qualquer um, imagine-se na de um ministro de uma Corte superior. Aliás, se o ministro tal afirmação como fanfarronice, ele não passa de um militante político. Esvai-se, portanto, o respeito que a ele devemos enquanto magistrado.

Estranho, imensamente estranho, é o fato de o TSE lutar desveladamente para que não haja uma maior transparência na segurança do voto para aquele que vai às urnas. O voto impresso é um direito inalienável do votante, que merece ser respeitado. Djalma Pinto sentencia: “todo o esforço para o aprimoramento no sistema de votação se justificaria para retirar, de uma vez por todas, o recorrente questionamento sobre a confiabilidade da urna eletrônica.” Lembrando-se ao caro leitor, que as nações mais desenvolvidas no mundo, do ponto de vista tecnológico, não adotam esse sistema de urna eletrônica. Pelo simples fato de que respeitam o seu eleitor, condição sine qua non para a plenitude de qualquer democracia.