sábado, 29 de julho de 2017

GERALDO AMÂNCIO, POETA DE PESO E MEDIDA



Barros Alves

            O cantador que improvisa versos ao som da viola rareia nestes tempos hodiernos em que a mediocridade de infernal barulheira é impingida ao povo como música, invade as mídias e encanta uma geração cuja sensibilidade estética está a confundir música com excremento. Poesia já nem se fala!!! Neste cenário pouco alvissareiro surge aqui e acolá um poeta popular que se atreve a pontear a viola e sair feito Quixote a arrostar a tempestuosa ignorância de uma maioria desacostumada de apreciar o belo. O cantador de viola é o gênio da raça. Já pelo dom de cantar improvisadamente, verso feito na bucha, conforme o dito e o pedido do ouvinte que lhe dá o mote; já pela capacidade de deslindar com espírito crítico ou laudatório o que vai pela sociedade. Tempos atrás tinham pouco ou quase nenhum estudo sistematizado. Atualmente, muitos já dedilham a viola com conhecimento abrangente sobre os acontecimentos nos quatro cantos do mundo, cantando uma poesia elaborada. Ontem como hoje, continuam geniais. Mas, confesso que os letrados não superam os analfabetos como o extraordinário Pinto do Monteiro, para citar apenas um exemplo. Entre nós ainda canta com a exaltação de um semideus da Poesia, um dos últimos grandes nomes da Cantoria. Geraldo Amâncio, cantador de reconhecidos méritos de menestrel popular, inscreve seu nome entre os insuperáveis rapsodos do povo, porque Deus lhe concedeu o dom de cantar as grandezas e misérias, alegrias e dores da nossa gente por intermédio de uma poesia improvisada da melhor qualidade estética, literariamente impecável, que lhe jorra da alma aos borbotões e chega aos nossos corações com o misterioso poder de emocionar. Em livro com feição autobiográfica que fez publicar recentemente, Geraldo Amâncio considera-se um “Andarilho do Canto e da Palavra”. Este, aliás, o título da obra. O livro, certamente por modéstia do autor, diz pouco da pujança poética desse andarilho que carrega em seu matulão uma imensidade de poesia que a todos encanta e enleva por onde passa.   

terça-feira, 4 de julho de 2017

A TRADIÇÃO BÉLICA DO ISLAM



Barros Alves

Pessoa presumivelmente bem informada, à vista de críticas que fiz ao Estado Islâmico, disse-me em tom de repreensão, que o conhecido grupo terrorista não é um Estado e muito menos islâmico. Quanto a ser o califado fundado pelo iraquiano Abu Bakr al-Baghdadi um Estado consoante os parâmetros conceituais da Ciência Política dentro do modelo ocidental, não me deterei no assunto. Quanto ao qualificativo que denota a filiação religiosa do grupo ouso discorrer sobre tal.

Por primeiro é fácil constatar a tradição belicosa do Islam, apesar desse vocábulo ter o mesmo radical semítico das palavras SALAM/SHALOM que significa PAZ. Porém, pelo viés histórico vale lembrar o escritor Hammudah Abdalati, o qual registra “que a história islâmica encerra NATURALMENTE episódios de guerra legal e justificada...” (“O Islã em Foco”, edição da International Islamic Federation of  Students, 1994, pág. 219). Essa justificativa, nem sempre convincente, se faz em nome da autodefesa.

Com efeito, a palavra JIHAD, que se deve traduzir corretamente por “esforço no caminho de Deus”, chancela a idéia corânica de que este “esforço” não deve ser apenas espiritual, mas em face de todas as necessidades da existência, aí incluída a preservação, a todo custo, do espaço geográfico da fé herdada do profeta Maomé. Nos primeiros tempos do Islam esse esforço (Jihad) servia para a expansão da fé. No entanto, os fatos, apesar de toda a retórica pacifista do Islam, têm demonstrado que a Jihad é uma conseqüência natural da práxis religiosa legada aos pósteros pelo Profeta Maomé e seus seguidores iniciais pouco pautados pela paz. Basta ver  o conflituoso processo de sucessão do Profeta, no século VII, pelos autodenominados califas (representantes) do líder morto.

Daquele tempo a esta parte, o Islam, em suas mais diversificadas facções, tem adotado uma postura belicosa em face de outros grupos, povos e nações que dele divergem. Esta é a constatação que fazem muitos dos que se debruçam sobre a história do mundo muçulmano, entre os quais destaco o professor J.-M Abd El Jalil, no seguinte comentário: “O Islã constituiu uma comunidade belicista(...), acreditando-se sempre ameaçada essa comunidade se refugia na luta através da polêmica e das armas. Por conseguinte, o Islã não será unicamente uma religião:será também uma organização política e um mundo cultural à parte; e tudo isso ao mesmo tempo. Esta concepção do Islã deve estar sempre presente ao espírito para se evitar o equívoco por demais corrente de julgá-lo a partir de um ponto de vista ocidental, do Cristianismo”. (Apud “Islamismo – História e Doutrina”, de Jacques Jomier. Ed.Vozes. RJ, 2001, pág. 159).

Este autor francês, profundo conhecedor do mundo árabe-islâmico, lembra que “a história do Islã comportou guerras suficientes para que apareçam com clareza os princípios diretivos nesse campo.” O Corão, livro sagrado dos muçulmanos está cheio de indicações a este respeito e nele recolhemos o exemplo a seguir: “Combatei na senda de Deus os que vos combatem; mas não sejais transgressores. Deus não ama os transgressores. MATAI-OS EM TODA PARTE ONDE OS ENCONTRARDES E EXPULSAI-OS DONDE VOS EXPULSARAM. A subversão é pior do que o homicídio." (Corão, sura 2, vers. 186-187/190/191). Grifo meu. Os radicais que professam o islamismo fanaticamente entendem que o mundo ocidental e cristão deseja destruí-los. Nós somos os transgressores.

Daí é que falece razão ao discurso “politicamente correto” de que o grupo terrorista Estado Islâmico não professa o Islamismo, como se a fé islâmica fosse algo monolítico e não contivesse centenas de facções, surgidos a partir dos grupos originais sunitas e xiitas. Não apenas esse grupo de assassinos, como também a Al Qaeda, o Hamas, o Hezbollah, o Bokhâri e vários outros, são, indiscutivelmente, cada um a seu talante, seguidores do Profeta Maomé. E praticam com convicção inabalável o “esforço no caminho de Deus”, a Jihad, entre nós definida como guerra santa. Tudo isso em nome de Allah, o Clemente e o Misericordioso.