quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

CULTO A UM FALSO DEUS

Barros Alves

O culto à personalidade não desabona nenhuma sociedade e o temos visto ser praticado ao longo do tempo nos mais diversos agrupamentos sociais. Todavia, quando este culto é dirigido de forma exagerada com características de fanatismo ele pode ser prejudicial à sociedade em face da ausência de discernimento causada exatamente pela falta de ponderação na observação das deficiências naturais do cultuado. Neste mister de se cultuar personalidades, política e religião se imiscuem, se entrelaçam, se confundem. Cá entre nós, basta um indivíduo se altear um pouco mais no contexto sócio-econômico e cultural e, de logo, surge a tendência em incensá-lo sem sequer um olhar mais perscrutador do caráter desse indivíduo.
Recentemente, as redes sociais alvoroçaram-se em face de uma desfeita de que teria sido alvo o conhecido compositor e escrevinhador Chico Buarque de Holanda, guru da pseudo-esquerda brasileira, propagandista da mais longa e cruel ditadura latino-americana, a ditadura dos Castros em Cuba; bem como defensor ardoroso da gatunagem que se institucionalizou sob o governo lulo-comuno-petista. Chico teria sido xingado publicamente por gente que pensa contrariamente a ele. Daí é que seus defensores, incluindo Lula, vieram a público defendê-lo, sempre exaltando seus méritos de intelectual e democrata.
Pra começo de conversa, democrata ele não é. Quem defende governos sabidamente autoritários, que tortura e prende adversários de idéias, como é o caso de Cuba, há cinqüenta anos sob uma ditadura onde impera a vontade de um homem, não tem moral alguma pra dizer que é democrata. Como intelectual, Chico é sem dúvida um inspirado compositor. No entanto é um cantor sofrível, um escritor medíocre e no terreno político um desastre, tão ruim quanto intelectuais colegas seus como Gabriel Garcia Márquez, Prêmio Nobel de Literatura, que passou a vida defendendo seu colega ditador Fidel Castro e tentando impingir ao mundo o discurso de que Cuba é uma democracia. Os ingênuos, ignorantes e desinformados acreditaram. Para desgraça da democracia!

Não esqueçamos que os alemães Martin Heidegger, luminar da filosofia moderna; Carl Schmitt, jurista de nomeada, eram nazistas. Como nazista era Ezra Pound, um poeta bem maior do que Chico Buarque, este um burguesinho nascido em berço de ouro, que encontrou no viés da propaganda de um socialismo guevariano que agrada sobretudo os saudosistas, um meio eficiente para ganhar muito dinheiro. Aliás, ao adquirir um apartamento fora do Brasil para descanso, trocou o Malecon de Havana pelos Champs Elisées de Paris. Um belo exemplo de comunista!

sábado, 23 de maio de 2015

A TRANSPOSIÇÃO DE ÁGUAS DO RIO SÃO FRANCISCO


Por Evandro Bezerra
Engenheiro agrônomo e diretor social da Associação dos Servidores do Dnocs

A transposição das águas do Rio São Francisco para as bacias carentes do Nordeste setentrional apresenta, ao longo dos seus quase 200 anos, duas histórias: uma institucional e outra relativa às vazões a serem transpostas.
Na série de acontecimentos sociais, políticos e econômicos que englobam a história institucional, vamos bater de frente que ela começou, cronologicamente, em 1818, quando um padre carmelita, João de Santa Rosa, falava da possibilidade de tal transposição e usou a termologia da época de canalização do Rio São Francisco para o Ceará, conhecido como um inédito de Marco Antônio de Macedo, publicado em 1820, o qual foi enviado a D. João VI, rei do Reino Unido de Portugal, Algarves e Brasil, sendo àquela época suplente de deputado federal pelo Ceará.
Em abril de 1821, às vésperas de deixar o Brasil de volta para Portugal, D. João VI teria recomendado ao seu filho, o imperador D.Pedro I, que diligenciasse a fim de verificar a “possibilidade de construção da obra e vantagens de tal empreendimento”. Como não existia por aqueles tempos tecnologia adequada para tal ideia, foi desfeita e caiu no esquecimento com a Confederação do Equador em 1824, movimento separatista ocorrido em várias províncias do Nordeste.
Em 1847-1853, novamente o Dr. Marco Antônio de Macedo, após a sua chegada da Europa, onde fora se atualizar para melhor ajuizar sobre a viabilidade de tal empreendimento, fez várias viagens ao Rio São Francisco, fazendo reconhecimento dos lugares que melhor se prestassem à canalização deste, tendo descoberto Cabrobó, que é o mesmo lugar aventado a 161 anos.
Em 1877-1879, com a seca dos três anos, a transposição volta à tona! Esta seca foi tão violenta que causou elevado número de mortes, onde o município de Mossoró-RN, de uma população de 4.000 habitantes aumentou para 25.000, só pela emigração, em que era comum a morte de pessoas pela fome e pela peste. No Ceará, verificou-se a emigração para Amazônia devido ao ciclo da borracha, chegando a 120.000, de uma população de 800.000 habitantes, em que 500.000 morreram e 180.000 emigraram. Segundo Rodolfo Teófilo, só o obituário de Fortaleza chegou a 63.163 pessoas.
Iniciado o século XX, por volta de 1912, foram realizados os estudos topográficos pela antiga IOCS, Inspetoria de Obras Contra as Secas, e em 1913, esse foi considerado inviável pelo seu primeiro diretor geral, Miguel Arrojado Lisboa. Em 1943, a discussão foi retomada pelo presidente Getúlio Vargas.
Com o início da construção da barragem de Sobradinho, em 1972, e com a sua conclusão e inauguração, em 1980, a transposição volta a ser lembrada, e surge o estudo de previabilidade com uma vazão de 800m3/s e o início da história das vazões de transposição. Essa vazão de 800m3/s teve como base a elevação do nível das águas ocasionado pela formação do lago e, em 13 de maio de 1981, foram publicados os editais de concorrência por iniciativa do Departamento Nacional de Obras Contras as Secas (Dnocs). Nos termos da licitação editada por aquele departamento, os 800m3/s seria das águas durante os 4 meses de cheia do São Francisco juntamente com as águas do Rio Tocantins que daria um volume transposto de 8.294.400.000m3 destinados aos estados do Piauí, 50%, do Ceará, 25%, 25% de Pernambuco, e, 25% restantes para a Paraíba e Rio Grande do Norte. Esse estudo foi realizado no governo João Figueiredo e era ministro do Interior, o coronel Mário Andreazza. Esse estudo caiu depois no esquecimento por vários motivos.
A segunda versão de projeto foi em 1985, no governo José Sarney, também sob a responsabilidade do Dnocs, e previa uma vazão de 300 m3/s, o que daria um volume transposto de 9.460.800.000 m3 de água em um ano.
Por ser a vazão muito elevada, em torno de 15% da modulada pela hidrelétrica de Sobradinho, ela causaria conflitos com os aproveitamentos existentes na própria bacia. Por isso, e por outros argumentos, foi abandonada, e surgiu a terceira versão do projeto que era do antigo Ministério da Integração Regional do governo Itamar Franco, em 1994.  
Previa uma vazão de 180m3/s, que daria um volume transposto de 5.674.480.000m3 de água em um ano. Considerada ainda muito alta, ela causaria defenestramentos no Rio São Francisco e foi trabalhada, então, uma vazão menor de 50 m3/s no Governo FHC que chegou no Governo Lula a 26m3/s com variação de zero a 127m3/s quando esta funcionar a plena carga. Explicado como projeto de garantia hídrica ele teria períodos sem nenhum bombeamento, outros somente com um ou alguns bombeamentos para as bacias receptoras, e, finalmente, situações em que todas necessitarão, concomitantemente, de bombeamentos. Observa-se, hoje, que, mantidos os 26m3/s, fala-se que a transposição seria de modo contínuo.

A VAZÃO DA TRANSPOSIÇÃO

Evandro Bezerra
Engenheiro agrônomo, diretor social da Associação dos Servidores do Dnocs

O problema da água é sério, ou melhor, é seríssimo. Segundo o Deputado Raimundo Gomes de Matos a vazão da transposição precisa ser revista, pois a mesma não contempla vários projetos econômicos para o Nordeste, como o Complexo Industrial e Portuário do Pecém, no Ceará. A bem da verdade, alguns nostálgicos governantes cearenses não sabiam, ou se sabiam fizeram ouvido de mercador, que no próprio Vale do Rio São Francisco sempre existiu e, ainda perdura, um grande conflito pela água entre Chesf e Codevasf, a primeira alegando a produção de energia elétrica e a segunda a implantação e operação de projetos de irrigação.
À evolução histórica institucional da transposição se seguiu a evolução histórica das vazões em espaço de tempo menor que a primeira. A segunda, então, nasceu com 800 m3/s passando a 300 m3/s, 180 m3/s, 50 m3/s e finalmente a 26 m3/s taxada de garantia hídrica quando antes seria de modo contínuo. Pelo sim, pelo não, esta é a outorga da Agência Nacional de Águas que coincide com a insignificante percentagem de 1,2% da vazão após Sobradinho para os Estados receptores depois de muitas divergências, que está muito aquém, mas muito aquém mesmo, das disponibilidades hídricas sociais de alguns Estados nordestinos como, por exemplo, o Ceará, que é em torno de 429 m3/habitante/ano. O Complexo Industrial e Portuário do Pecém foi, também, uma obra eleitoral e impensada. Como, então, destinar água para atividade econômica supracitada e também, para irrigação, que sempre foi um dos objetivos do projeto?
O Ceará tem água? O rio São Francisco tem água para alimentar a inserção Regional e a Sinergia Hídrica contemplada no projeto? O Ceará tem água para alimentar a siderurgia, tem mercado consumidor, tem matéria-prima para siderurgia?
O deputado Raimundo Gomes de Matos tem razão, segundo o seu pensamento, os idealizadores e elaboradores do projeto não levaram em consideração uma realidade mundial que é o aquecimento global e a realidade hídrica do São Francisco, relacionada à disponibilidade hídrica e social daquele rio e do estado do Ceará.
A disponibilidade hídrica social preconizada pela ONU é de 1.000 m3/habitante/ano. Mesmo com a sinergia hídrica proporcionada pela transposição a vazão prevista para o Ceará não atenderia, também, as necessidades humanas, com uma vazão irrisória, de apenas 8 m3/s. Como, então, rever tal vazão se tem que ser observado os usos na bacia do São Francisco e que mesmo sem transposição a água do Velho Chico está comprometida? De 2002 para cá ele secou três vezes, as hidrelétricas rio abaixo pedem socorro. O rio secou nas suas nascentes e muitos dos seus afluentes, também. E no quadro atual de secas que pode prolongar-se como rever tal vazão? Como rever a vazão se a mesma não dá nem para atender a disponibilidade hídrica, social do Ceará e dos outros estados receptores?
Quem é o responsável pela situação atual do Rio São Francisco? A agressão causada pelo homem, com a prática do desmatamento. A vegetação é um elemento condicionante da seca, e enquanto termostato natural, a sua destruição contribui para acelerar o fenômeno da estiagem. Roguemos pela revitalização do Velho Chico e, também, das bacias receptoras nordestinas através de projetos de reflorestamentos. A Caatinga, apesar de constituir-se na penúltima forma biofísica antes do aparecimento do deserto, como toda vegetação, embora não economize água, ela regulariza o ciclo das chuvas retendo 30% destas, impedindo o assoreamento de rios, açudes e drenos.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Reforma política da CNBB? NÃO ASSINE!

Por Percival Puggina (*)

Sou leigo católico. Não faz parte de meus deveres de batizado seguir a orientação da CNBB para uma reforma política no Brasil. Reforma política é tema político e quem entra na pauta vai, necessariamente, para o contraditório. Ao se comprometer tanto com o assunto, a CNBB se envolve em algo que não lhe diz respeito e onde, mesmo entre juristas e cientistas políticos, as opiniões divergem. Como leigo, sou membro do Corpo Místico de Cristo (que é a própria Igreja, cuja unidade defendo e integro), mas quando a Conferência envereda no campo político, é ela que desliza para o espaço das opiniões e para os conflitos inerentes a essa atividade, desligando-se do que deve ser unitário. Nem fica bem invocar a unidade para eximir-se do contraditório, ou para fazer um tipo de crítica que tenta desqualificar a crítica.
Um grupo de 112 entidades uniu-se em torno de um projeto de reforma política para o país. Seguindo a velha cartilha da mobilização, iniciaram coleta de assinaturas, em busca do mínimo constitucionalmente exigido para os projetos de iniciativa popular – 1,5 milhão de adesões. O projeto foi amplamente divulgado em outubro de 2014 pelo movimento Eleições Limpas (www.eleicoeslimpas.com.br) e hoje é acionado por uma certa Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas (procure no Google por esse nome e clique em “Quem somos”).
Examine a lista e depois me responda: qual o partido ou tendência ideológica que lhe vem à mente quando lê MST, CUT, Via Campesina, CONTAG, UNE, FENAJ? Em meio a uma batelada de ONGs que vivem às nossas custas, com acesso franqueado a verbas públicas, também integram a tal Coalizão: o MMC (Movimento das Mulheres Camponesas, aquelas que destruíram os laboratórios da Aracruz em 2006 e atacaram recentemente, em Itapetininga, um laboratório da Suzano Papel e Celulose), a UBM (entidade de mulheres pró-aborto), a RFS (Rede Feminista de Saúde, pró-aborto), a REBRIP (rede de ONGs e movimentos sociais com propostas “alternativas”), a Liga Brasileira de Lésbicas, o Movimento Evangélico Progressista, a Articulação Mulheres Brasileiras (pró-aborto e contra os direitos dos nascituros). Que interesses em comum podem ter com a CNBB?
Qualquer pessoa minimamente informada percebe que “tem PT nesse negócio”. E tem. A proposta é um espelho das questões centrais do projeto petista de reforma política: voto em lista (acrescentando um segundo turno com voto nominal); financiamento exclusivamente público, ou seja, custeado pelos pagadores de impostos; um reforço aos instrumentos de democracia direta (bebendo água no Decreto Nº 8243, aquele dos sovietes). Agora, uma diferença. Enquanto a proposta petista falava em igual número de candidaturas masculinas e femininas aos cargos legislativos, a proposta da CNBB é mais moderninha e fala em igualdade de “gênero”. Pode? Pode. É a CNBB. Enfim, a concepção do projeto é tão petista que o site do PT, em 26 de fevereiro, comemorou o manifesto da CNBB, conforme pode ser lido em (http://www.pt.org.br/cnbb-e-oab-lancam-manifesto-em-apoio-a-reforma-politica/).
Os católicos já foram solicitados pela CNBB, em 2002, a assinar por um calote da dívida externa (chamado de “auditoria”) que absolutamente não era necessário; convidados a assinar por um plebiscito e uma nova constituinte que a ninguém interessou; convencidos de que a salvação moral da política viria da lei da ficha limpa (uma lei boa, aliás) que precedeu a maior ladroagem da história. Agora estão escaldados, e as assinaturas pela Reforma Política patinam, distantes do 1,5 milhão de adesões. Por isso, surgiu um formulário suprimindo do cabeçalho os nomes das entidades que revelam a vinculação da iniciativa aos já desacreditados interesses petistas. Desculpem-me, mas isso não se faz. Parece coisa de, digamos assim, petistas.
(*) Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; "Cuba, a tragédia da utopia" e "Pombas e Gaviões"; integrante do grupo Pensar+ e membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

sábado, 2 de maio de 2015

O AÇUDE CASTANHÃO NUMA VISÃO PROSPECTIVA

O Dr. Cássio Borges é Engenheiro Civil, formado pela Escola Politécnica de Pernambuco e especializado em recursos hídricos e barragens pela Escola Nacional de Engenharia e pela Pontifícia Universidade Católica (PUC), ambas do Rio de Janeiro.  De autoria de Cássio Borges publico o artigo que segue.

Quando fui diretor regional do DNOCS na década de 70, à época em que era diretor-geral daquele departamento o saudoso e brilhante engenheiro José Lins de Albuquerque que, diga-se de passagem, apoiava e prestigiava todos os meus atos relativos à questão hídrica do Estado do Ceará, tomei a decisão de não instalar as comportas do Açude Orós, já adquiridas e vendidas como ferro velho, reduzindo, assim, a capacidade global de sua acumulação de 4,0 bilhões de m³, para a qual foi projetado e construído, para apenas 2,0 bilhões de m³ tendo, para isso, apresentado, na ocasião, as necessárias justificativas dessa minha decisão, entre as quais, a inundação de significativa parte da cidade de Iguatu.
Relembro o fato acima, visto que, vez por outra, algum segmento (isolado) da sociedade cearense faz referência lisonjiosa ao Açude Castanhão usando adjetivos monossilábicos como, por exemplo, chamando-o de “milagroso”, num claro propósito de blindar qualquer argumento contrário à sua existência e impô-lo, definitivamente, à opinião pública, porém nunca é demais lembrar que fui favorável a essa obra, porém com 1,2 bilhão de m3. E me pergunto: “milagroso” por quê? Terá sido porque ele desviou as águas do Rio Jaguaribe para a atmosfera com uma inconcebível evaporação de 20 m3/s? Será porque, apesar do seu gigantismo (o maior açude em regiões semiárida do mundo) sua vazão regularizada, de 10 m³/s é (pasmem!) inferior à do Açude Orós (12 m3/s), apesar deste ser 3,5 vezes menor em volume d`água acumulado do que ele? Que milagre é este?
Vejo nesses propósitos intencionais de blindar ou impedir qualquer argumento ou estudo que venha a ser a ser proposto semelhante ao que foi decidido em relação ao Açude Orós na década de 70, acima referido. Aos que não se lembram, ou não tenham tido conhecimento, recordo que o Açude Castanhão foi condenado por razões técnicas, econômicas, sociais e ambientais, por sete votos a zero no Tribunal da Água (nos moldes do Tribunal Internacional da Água, sediado em Copenhague, na Dinamarca), o qual foi realizado em Santa Catarina em abril de 1993. Em defesa desse empreendimento estiveram dois dos mais destacados engenheiros da Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará.
Infelizmente, por razões estranhas e inexplicáveis, a Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará, desrespeitando o bem elaborado e correto planejamento do vale do Rio Jaguaribe, feito pelo DNOCS, substituiu a construção do Açude Castanheiro, no Rio Salgado, em Lavras da Mangabeira, afluente principal do Rio Jaguaribe por sua margem direita, pelo Castanhão, próximo do litoral, o que motivou amplo debate que durou 14 anos, tendo como pano de fundo, verdade seja dita, os interesses da portentosa empreiteira Andrade Gutierrez, responsável pela construção dessa obra.
A verdade é que, em resumo, os colegas engenheiros que antes eram contrários à referida obra e comungavam comigo do mesmo pensamento, de repente passaram a ser os mais ferrenhos defensores desse empreendimento. Tudo isto contei em livro, de 331 páginas, do qual não retiro uma só vírgula, que escrevi em 1999, intitulado “A Face Oculta da Barragem do Castanhão-Em Defesa da Engenharia Nacional”, no qual consta, no Capítulo XXXI, os detalhes sobre o Julgamento no Tribunal da Água e tudo o que ali está dito vem sendo comprovado pela história nesses onze anos de sua existência, para tristeza da população cearense que foi, lamentavelmente, enganada quanto aos reais benefícios desse empreendimento, um Ceará Aquático, como dizia a propaganda oficial.
Em síntese, o Açude Castanheiro, na cota (altura topográfica) 239m, portanto com amplas possibilidades de levar a água por gravidade, sem necessidade de bombeamento, para diversas regiões do Estado do Ceará, foi substituído, irresponsavelmente, pelo Castanhão, na cota 50m, o qual domina apenas cerca de 30% do Vale do Jaguaribe, justamente uma das partes menos sujeitas às secas, que é o litoral. Logicamente, o próprio Castanheiro, se este tivesse sido construído estaria também beneficiando esta mesma área, inclusive a Região Metropolitana de Fortaleza.
A seguir, faço um breve estudo comparativo do Açude Castanheiro em relação ao Açude Castanhão:
1) – A primeira coisa que devo ressaltar é que o volume d`água de acumulação do Castanhão é 3,5 vezes maior do que o do Castanheiro. O primeiro tem sua capacidade de acumulação de 6,7 bilhões de m3, enquanto o segundo acumularia, se construído, no máximo, 2,0 bilhões de m3;
2) – O Castanhão tem sua parede, digo, sua barragem, uma extensão de 12.000 metros, enquanto o Castanheiro teria (pasmem!) apenas 40 metros;
3) – O Castanhão foi construído num seção já perenizada pelos Açudes Orós e Banabuiú e mais recentemente pelo Açude Figueiredo, concluído no ano passado, o qual já fazia parte do planejamento do DNOCS desde a década de 50;
4) – A bacia hidráulica do Castanhão é um mega espelho aberto exposto ao sol e aos ventos o que favorece à elevada evaporação de 20 m3/s, conforme observado no atual período de quatro anos de seca. Esta alta evaporação já era prevista por mim no livro que escrevi acima referido;
5) A vazão regularizada do Castanhão, antes tida e havida como sendo da ordem de 30,00 m3/s, depois 19,0 m3/s, somente no final do ano passado foi reconhecida como sendo de apenas 10 m3/s, inferior à do Açude Orós que é de 12,00 m3/s, apesar deste ter um volume de acumulação d`água 3,5 vezes menor do que aquele. Repito: Que milagre é este?
É lamentável que os atuais dirigentes da política de recursos hídricos do Estado do Ceará não queiram reconhecer os erros que foram cometidos em relação ao projeto do Açude Castanhão, pois só reconhecendo a existência deles, é possível corrigi-los ou minimizá-los. É fundamental ter a humildade de reconhecer as falhas e não se considerarem os donos da verdade. A construção, ainda que tardia, das Barragens do Castanheiro e Aurora, e outras de portes médios, poderão fazer parte do planejamento dos recursos hídricos, não só do vale do Rio Jaguaribe, como do próprio Estado do Ceará como um todo, considerando-se a vazão que deverá provir do Rio São Francisco. Basta ter visão estratégica e vontade política. Não se deve desprezar a história, pois aprendemos com os erros do passado.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

UM COMUNISTA SANTO?



Barros Alves


         
 Após a hecatombe que varreu a Europa na primeira metade do século passado, muitos intelectuais que combateram denodadamente o nazi-fascismo, bandearam-se inopinadamente para as hostes comunistas. Tal fato espantou sobretudo intelectuais cristãos como o teólogo e cardeal francês Henri de Lubac, que expressou suas preocupações em obras basilares para o entendimento da sutilidade do mal causado pelo humanismo travestido de cristianismo, pregado por altos dignitários da própria Igreja. Já em 1949, numa carta que escreveu aos “cristãos progressistas”, Henri de Lubac chamava a atenção para o fato de que eles não deveriam “fazer o jogo do pior dos totalitarismos, porque depois de haverem lutado contra o nazismo, não se dão conta de estarem lutando em prol de outro totalitarismo, o do Partido Comunista.”
            Entre nós também vários intelectuais, levados pelos ventos da ilusória propaganda comunista de paz e igualdade disseminada em todo o planeta no pós-guerra,  optaram equivocadamente pela defesa de postulados que se coadunam perfeitamente com os interesses mesquinhos e anticristãos do marxismo-leninismo. E isto bem antes do boom denominado Teologia da Libertação, “a fumaça de Satanás que entrou pelas frestas da Igreja”, consoante frase do Papa Paulo VI em outro contexto. Todavia, a ideologia da desgraça do homem continua sua ação deletéria na Igreja e no mundo, arrimada em um discurso presidido pela desfaçatez e pela hipocrisia.
            A Teologia da Libertação é um desses males que adentram sorrateiramente – às vezes nem tanto – no Corpo Místico de Cristo, a Igreja, e como um câncer espiritual e intelectual vai minando os caminhos do divino, na tentativa felizmente vã de destruir o sagrado, colocando em seu lugar um humanismo ateu torpe e inconsequente. Assim é que nomes respeitáveis do pensamento teológico da contemporaneidade, expõem com tanta competência quanto com poder sofista, um discurso que mistura o político com o religioso e é a um tempo populista, demagógico e herético. Esses teólogos, alertava Lubac “Querem uma libertação social, mas o que ocorre de fato é que dão clara contribuição para o estrangulamento do homem, para uma organização tirânica, policialesca, que regula e manieta o pensamento e as consciências, com um entusiasmo enorme de destruir o princípio da liberdade espiritual que o cristianismo tem introduzido no mundo.”
Com efeito, esses teólogos que esteiam suas argumentações na dialética demoníaca de Marx, nada mais querem do que “descristianizar as almas.” O discurso é piedoso, mas hipócrita; sereno, mas pregam a revolução e a violência para a consecução de seus objetivos; adoçam as palavras com a mensagem sagrada do Santo Evangelho de Jesus Cristo, mas cooperam com o mal ao apoiarem regimes políticos que odeiam a religião e, em especial, o Cristianismo. Esses teólogos e pregadores da libertação têm, de fato, um discurso angelical. Porém, se olharmos a sua essência veremos sem muito esforço que é um discurso enganador, tergiversante, anticristão. E nos faz lembrar a admoestação do apóstolo Paulo quando escreve aos Gálatas: “Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho, o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o Evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós, ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além que vos temos pregado, seja anátema.” (Gl. 1.6-8)
Um dos nomes exponenciais da Igreja na América Latina, sobretudo no Brasil, foi um desses equivocados que se deixaram levar pela falsidade de um humanismo que insiste em equiparar-se ao Cristianismo. Dom Hélder Câmara, cognominado Bispo Vermelho, exatamente em razão de suas ideias consentâneas com as doutrinas marxistas, fez o jogo da ideologia totalitária de forma entusiasmada. Era um homem bom, mas com ideias totalmente em descompasso com a doutrina bissecular assentada pela Igreja em inúmeros documentos conciliares e pontificiais. Ele chegou ao ponto de dizer que o Brasil deveria adotar o mesmo sistema econômico da então Tchecoslováquia comunista. Era defensor intransigente da China e de Cuba, nações governadas pela tirania comunista. Quando arcebispo de Olinda e Recife, a título de combater a ditadura militar, correu mundo pregando ideias marxistas travestidas com a capa do Evangelho de Jesus Cristo. É este bispo defensor de uma “doutrina intrinsecamente má” (Pio XI sobre o marxismo) que alguns católicos querem elevar à glória dos altares.
Quando vejo a procissão de incensadores da canonização de Dom Hélder Câmara, é como se estivesse a sentir a mesma angústia de Henri de Lubac em face das investidas do comunismo, às vezes travestido de anjo, contra a Santa Igreja Católica. O Cardeal Lubac profere sentida indagação dirigida aos irmãos cristãos: “Como conseguir que se deem conta de que o que se tem vivido e o que está em jogo é o desprezo pelo espiritual?” É mister, pois, não esquecermos que milhões de marxistas em todo o mundo, esses mesmos que odeiam o espiritual, estão exultantes com a possível canonização de Dom Hélder Câmara, porque o bispo Vermelho alcançar a glória dos altares é o mesmo que colocar lá as ideias comunistas.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

UM LIVRO, UMA EMOÇÃO E MUITOS ENSINAMENTOS

Tenho uma amiga chamada Cleonir Alexandre. Sou testemunha do desvelo que sempre dedicou à formação das filhas. Tive oportunidade de por algum tempo acompanhar a sua luta intimorata,  arrostando obstáculos para proporcionar o estudo das jovens. O tempo passa e o destino nos leva a trilhar sendas diversas. Um dia desses, porém, por artes do Divino, eis que Cleonir, sabedora de que sou um aficionado pela leitura, me presenteia um livro. Não um livro qualquer. Um livro que, ao recebê-lo, me deixou verdadeiramente emocionado. Trata-se de uma produção intelectual de uma das filhas da Cleonir, a Lidiany, que conheci pequenina e frágil, hoje uma bela psicóloga, que fez publicar seu primeiro livro: EDUCAÇÃO PARA TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO, uma aproximação da perspectiva dos gerentes de Unidades Básicas de Saúde de Fortaleza  acerca da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde. Trata-se de um alentado estudo, contribuição avançada para a compreensão dos mecanismos que determinam uma boa formação como o melhor caminho para a prática profissional dentro do Sistema de Saúde. O trabalho de Lidiany Alexandre Azevedo constitui uma tentativa bem sucedida de apontar caminhos para uma profícua integração entre a teoria e a práxis na área de saúde, que possibilita a quantos lerem não apenas uma ideia das necessidades dessa área, mas, sobretudo, aponta caminhos para transformar situações. Com este livro, Lidiany Azevedo não apenas me emocionou pelo afeto que lhe tenho, mas também me proporcionou muitos ensinamentos. Certamente outros livros da lavra do talento e da inteligência de Lidiany virão para nos deliciar com sua leitura e nos ensinar muito mais.

O NORDESTE DO DR. PEDRO SISNANDO

Hoje à tarde tive oportunidade de assistir a uma brilhante palestra do Dr. Pedro Sisnando Leite, sócio efetivo do Instituto do Ceará (Histórico, Geográfico e Antropológico), entidade presidida com proficiência e descortino pelo Dr. Ednilo Gomes de Soárez. Reconhecidamente um dos maiores estudiosos das questões nordestinas, Dr. Pedro Sisnando, ocupou elevados cargos no Banco do Nordeste do Brasil e no governo do Ceará, notabilizando-se como pesquisador dedicado às causas da nossa Região. Foi sobre o Nordeste que ele discorreu com maestria, fazendo um resgate memorial dos trabalhos que realizou juntamente com outros colegas em prol do crescimento sócio-econômico e cultural da terra e povo nordestinos. Após o momentoso evento dos mais elucidativos, o conferencista distribuiu aos presentes duas obras de sua lavra, as quais traçam um registro histórico da luta travada em favor do Nordeste nas décadas de 1960 e 1970, quando plantaram o embrião de um processo desenvolvimentista para a Região, o qual esvaiu-se na irresponsabilidade político-administrativa de governos posteriores. Essa trajetória de estudos e pesquisas, de dedicação e empenho de uma equipe que resolveu pensar o Nordeste com grande desvelo e cientificidade, está contida nas obras ECONOMIA DO NORDESTE - PROPOSTAS DE POLÍTICAS NA DÉCADA DE SETENTA (em parceria com o Dr. José Nicácio de Oliveira) e DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA, INDUSTRIALIZAÇÃO E POBREZA RURAL NO NORDESTE - RESGATANDO A HISTÓRIA.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

OPOSIÇÃO NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO CEARÁ VOA EM CÉU DE BRIGADEIRO

A oposição hoje bateu forte no governo, sobretudo na megalomaníaca ideia de se construir um Aquário oceânico pra inglês ver no Ceará. O deputado Heitor Férrer puxou o bloco da pancadaria, que teve como mote a decisão da Secretaria de Turismo de suspender a obra durante 60 dias. Na verdade, a "Mansão pra Peixe", como apelidou o Heitor, não está sob hipótese nenhuma no rol de prioridades do povo cearense, que ainda por cima sofre mais uma vez as agruras de longa estiagem. Interessante é que a oposição está voando em céu de brigadeiro, porque o líder do governo, deputado Evandro Leitão, não tem aparecido em Plenário. Se não fosse a atuação decidida do vice-líder governista, deputado Júlio César Filho, tudo seria um passeio da oposição na crítica aos
desacertos que o governo atual herdou do anterior.

MENSAGEM DO GOVERNADOR BENEFICIA IRMÃO DO EX

O governador Camilo Santana enviou à Assembleia Legislativa do Ceará, Mensagem de número 7.719, de 6 de fevereiro, acompanhada de projeto que altera a lei 13.875, de 7 de fevereiro de 2007, a qual define da estrutura administrativa do Estado. A matéria introdutória da Mensagem é um arrazoado que não passa de explicar o óbvio ululante, qual seja o de que todo governo em seu começo trata logo de ajeitar-se a seu modo.
No caso em questão fica tudo como dantes no quartel de Abrantes, até porque o governo que se inicia é uma continuação do que saiu. Com um detalhezinho importante: a mensagem engorda sobremodo a Secretaria das Cidades, cujo titular é ninguém menos do que o senhor Ivo Gomes, irmão do ex-governador Cid Gomes. Entre outras alterações, a Secretaria das Cidades vai receber em sua estrutura o DETRAN, um dos órgão que mais arrecada no Estado. Mais atribuições, mais dinheiro e, consequentemente, mais poder. Confira:
http://www2.al.ce.gov.br/legislativo/tramit2015/7719.htm

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

SEM OS DIREITOS HUMANOS, MAS COM O MEIO AMBIENTE

Em razão de preconceitos manifestamente religiosos que deram sustentação a uma campanha estúpida promovida por setores da esquerda, a deputada Dra. Silvana (PMDB), não assumiu a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Ceará. Todavia, foi-lhe confiada com justeza a presidência da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento do Semiárido. Ao assumir o cargo, deixou claro que não é especialista no assunto, mas que vai trabalhar com uma equipe das mais qualificadas, que entende bem do traçado. Ademais, a vice-presidência da Comissão coube ao deputado Roberto Mesquita, do Partido Verde, agremiação cuja filosofia de atuação assenta-se na defesa do meio ambiente sustentável.

CULTURA PARA O GOVERNO É BANDA DE FORRÓ

A Assembleia Legislativa continua sem compreender seu elevado desiderato de legislar para o povo. A Comissão de Orçamento derrubou emenda de autoria do deputado Heitor Férrer, apresentada a Mensagem do governo que destinava 34 milhões de recursos para o setor cultural. A propositura do deputado pedetista redistribuía de forma equilibrada estes recursos, inclusive beneficiando mais os órgãos que cuidam da memória cultural e da leitura e do livro. Heitor recorreu ao Plenário da Casa, mas foi derrotado. Prevaleceu a vontade do governo que quer os dinheiros públicos destinados a bandas de forró. E pior: bandas de forró de péssima qualidade.

CADÊ O LÍDER?

Os próprios colegas de Parlamento estão a estranhar a decisão do governo Camilo Santana de designar para líder do governo na Assembleia Legislativa do Ceará, o deputado pedetista Evandro Leitão, marinheiro de primeira viagem. Evandro tem sido absenteísta na Casa. A cadeira dele está sempre vazia. Para alguns deputados, Evandro seria uma trava na ação oposicionista do seu colega de partido, Heitor Férrer. Mas esta versão não se sustenta porque Heitor já pregou aviso: "Cumprirei rigorosamente meu mandato com a retilineidade com que tenho atuado na Casa. Mina cartilha é a Constituição e as reivindicações da sociedade". Outros há que entendem a nomeação de Evandro simplesmente como um ato de segurança e tranquilidade do governo em relação à bancada situacionista. Porém, nem tudo são flores. A oposição cresceu em quantidade e em qualidade e vai dar muitas dores de cabeça ao governo. Até porque este que aí está é uma continuação do outro. Nas virtudes e nas mazelas. E estas são em maior número do que aquelas. Pelo menos é assim que pensa a oposição. há ainda aqueles mais ferinos que dizem estar o deputado Evandro Leitão muito preocupado com o Ceará. Mas é o Ceará time de futebol.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

NEM JIHAD ISLÂMICA NEM CHARLIE HEBDO



Barros Alves
Poeta e jornalista

Os trágicos acontecimentos que têm ocorrido nos últimos dias em vários países do mundo, sobretudo o massacre contra jornalistas do Charlie Hebdo, na França, impõem uma reflexão profunda sobre as históricas relações entre Ocidente e Oriente, especialmente entre o Cristianismo e o Islamismo. A primeira constatação é que essas relações sempre foram marcadas por tensões, menos no respeitante ao diálogo interreligioso do que nos aspectos culturais dos povos envolvidos. Mas, entendemos que constitui grave erro de alguns analistas olvidarem a questão religiosa dos conflitos referidos, jungindo-os a apenas ambições políticas e de poder. Uma coisa, em definitivo, não exclui a outra. Ao contrário, imbricam-se indelevelmente. Começa-se pelo fato de que não há compartimentalizações no pensamento islâmico. O Islamismo, como nos lembra o professor Peter Demant,  é a um só tempo uma religião (din), com suas crenças, rituais, normas, consolações etc.; como também tem um profundo sentido comunitário (umma), cujo ‘modus vivendi’ está assentado firmemente nas tradições iniciadas com os ensinamentos do Profeta Maomé (sunna – daí, sunitas). Estes aspectos regularizam toda a vida do muçulmano: educação, comércio, governo, sistemas jurídicos e filosóficos, relações de gênero.
Em face das inúmeras agressões físicas e morais –sobretudo estas – ocorridas contra o mundo islâmico desde o seu nascimento no século VII d.C., persiste no Islã um arraigado senso de autodefesa. Para alguns, mania de perseguição. Isto faz com que os ensinamentos corânicos sejam interpretados de maneira absoluta, sem os relativismos que comandam a hermenêutica do livro sagrado dos cristãos. É mister lembrar que enquanto para o cristão Jesus Cristo é o Deus encarnado, guardadas as devidas proporções, para o muçulmano o Alcorão é uma espécie de “Deus enlivrado”. Na cabeça do muçulmano o Alcorão é a “ipsissima verba” de Deus, ou seja, é a própria palavra de Deus que revelou o longo Poema Corânico ao Profeta Maomé pela boca do Anjo Gabriel. De modo que essa mentalidade permeia toda a cultura do mundo islâmico, tanto fundamentalistas quanto outros ramos do Islã, os quais, aliás, são muitos.
Esta problemática sócio-histórico-teológica está limpidamente exposada no Alcorão: “Combatei nas sendas de Deus os que vos combatem; mas não sejais agressores ou transgressores. Deus não ama os agressores ou os transgressores. Matai-os em toda a parte onde os encontrardes e expulsai-os donde vos expulsaram. A subversão é pior do que o homicídio” (Alcorão, Sura 2. Versículos 186,187,190, 191). Considere-se que a “expulsão” e a “subversão” de que fala o texto corânico é de natureza não apenas física, mas sobretudo moral. A revelação do texto ocorreu quando o Profeta e seus seguidores foram expulsos de Meca e fugiram para Medina no ano 622, exatamente em face das visões extraordinárias do líder. Ao episódio deu-se o nome de Hégira.
O intelectual J.-M.  Abd el-Jalil, autor de uma História da Literatura Árabe, escreveu um ensaio sociológico intitulado “L’Islam et nous” (“O Islã e nós”), cuja leitura nos dá uma ideia concreta dessa tensão permanente entre o mundo islâmico e os infiéis, ou seja, todos aqueles que não professam a fé do Profeta: “O Islã continua dominado por uma atitude de luta...defensiva. Primeiro perseguido porque reclamava a exclusividade do culto (‘ibadah) para Allah, Deus ‘sem sócio’, ‘sem rival’, nem filhos, nem ‘filhas’, nem ‘esposas’, acabou constituindo-se em coletividade agressiva por ficar na defensiva: internamente, contra os ‘hipócritas’ e os judeus; externamente, contra os ‘associonistas’ - politeístas de Meca(...) O Islã não será unicamente uma religião: será também uma organização política e um mundo cultural, à parte; e tudo isso ao mesmo tempo. Esta concepção do papel do Islã deve estar sempre presente no espírito, para se evitar o equívoco por demais corrente de julgá-lo a partir de um ponto de vista ocidental, do Cristianismo. Também, por causa disso, o Islamismo permanece ainda a religião da massa, da coletividade, mais do que simplesmente coisa do indivíduo face a seu Deus.”
Se artistas como os do Charlie Hebdo achincalham e vilipendiam os símbolos cristãos e de outras religiões sem que lhes sejam impostas quaisquer normas, o mesmo não ocorre quando se trata do fundamentalismo islâmico. Disto eles sabiam e correram o risco propositadamente. Impõe-se lembrar que a sociedade que abriga o Charlie Hebdo e similares é, também ela, em certa medida, paradoxalmente, pelo menos em tese, uma sociedade fundamentalista na ilimitada valorização da liberdade. A liberdade não pode ser um valor absoluto, porque se assim admitirmos, os assassinos dos cartunistas teriam a liberdade de matar. Por outro lado, o discurso de liberdade de Imprensa se tornou falacioso  no momento em que o governo francês ordenou a prisão de um cartunista que fez humor com os mortos pelos terroristas islâmicos. Ademais disto, não se pode confundir gozação execrável e antirreligiosa com humor. O riso, uma das mais belas manifestações do espírito humano, não deve jamais descambar para a agressão aos sentimentos do outro, notadamente quando se trata do sentimento religioso que assoma do mais profundo da alma humana.
             

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

PARA TRÁS, BANDIDOS!!!


Hoje baixou no ex-senador Cid Carvalho a alma rebelde de seu pai, o poeta Jáder de Carvalho, de quem tive a honra de ser amigo. Cid faz um comentário diariamente, às 12h, na Rádio Cidade, de Fortaleza, subordinado ao título DOA A QUEM DOER. Hoje ele descascou o pau no governo lulo-comuno-petista, em razão da suspensão da construção da Refinaria Premium no Ceará. Do alto de sua intocável honorabilidade ele invectivou:
"Este é um governo mentiroso e traidor. Lula e Dilma traíram seus correligionários, traíram os governadores Lúcio Alcântara e Cid Gomes, aliados do governo; traíram sobretudo o povo cearense. O que a presidente Dilma fez com o Ceará é uma agressão sem nome." E terminou gritando em alto e bom som: PARA TRÁS, BANDIDOS!!!

"LÁ A JUSTIÇA É IMPLACÁVEL" Entrevista com o advogado norte-americano Robert Luskin

Entrevista Robert Luskin

Por Malu Gaspar

Um dos maiores criminalistas dos Estados Unidos afirma que as investigações do petrolão em seu país serão profundas e podem levar a uma severa punição de empresas brasileiras.

O criminalista Robert Luskin é um personagem típico de Washington: integrante do primeiro time da advocacia americana, circula entre republicanos e democratas com a mesma desenvoltura e conhece como poucos os meandros da burocracia governamental. Mas, apesar de ter ganho notoriedade defendendo clientes famosos — Karl Rove, ex-assessor do presidente George W. Bush acusado de divulgar informações contra uma agente da CIA, e o ciclista Lance Armstrong, alvo de um escândalo de doping —, sua maior especialidade é a lei que pune corporações internacionais por pagar propina para obter contratos, o Foreign Corrupt Practices Act. Além de dar aulas sobre o tema na Universidade de Georgetown, em Washington, Luskin, 64 anos, ex-promotor formado em Harvard, já defendeu dezenas de multinacionais em inquéritos do gênero. Nesta entrevista a VEJA, ele informa que as investigações sobre o petrolão nos Estados Unidos vão desvendar toda a extensão do esquema. Até empresas que não atuam lá, entre elas algumas das empreiteiras, poderão ser alcançadas pelas pesadas punições estabelecidas pela lei americana.

As investigações sobre o escândalo da Petrobras nos Estados Unidos podem atingir empresas brasileiras que pagaram propina para obter contratos?

É bem possível. Os Estados Unidos interpretam a lei de forma bastante abrangente. Se a empresa contraiu um empréstimo aqui, se alguma transação financeira foi intermediada por instituições bancárias americanas ou um dos envolvidos é americano, o governo pode decidir entrar no caso. Foi o que ocorreu com a petroleira francesa Total, investigada por ter pago milhões em propinas a um funcionário público no Irã. Não havia praticamente nada que ligasse a história aos americanos, mas um único pagamento, justamente o primeiro, de 500 000 dólares, foi feito a partir de uma conta bancária nos Estados Unidos. O governo passou a investigar o escândalo, e a Total foi multada em 398 milhões de dólares. A empresa até poderia ter enfrentado o governo em um processo judicial alegando falta de legitimidade, mas preferiu selar o acordo porque, se perdesse, o custo seria bem mais alto do que a multa.

No caso Petrobras, a quanto podem chegar as multas?

Não se pode dizer antes que se saiba exatamente em que projetos houve negociata, quanto de propina foi pago e qual o ganho obtido. É a partir desses dados que se calculam não apenas a multa mas também eventuais penas de prisão. Para chegar a um número, o Departamento de Justiça e a Securities and Exchange Commission (SEC, o órgão fiscalizador do mercado americano) vão se juntar e aprofundar a investigação. Foi esse o procedimento no caso da Alstom. A apuração começou por um episódio ocorrido na Indonésia e foi ganhando vulto à medida que avançava. A multa à multinacional francesa foi de 772 milhões de dólares. A mesma força-tarefa vai ser acionada no escândalo Petrobras. No final, acho muito provável que as empresas brasileiras envolvidas façam acordo e aceitem encerrar o caso pagando a multa.

Por que as empresas tendem a fazer acordo?

É difícil imaginar uma companhia com ações na bolsa americana litigando contra Washington em um caso de corrupção. Nenhuma fez isso até hoje, porque perder nos tribunais significaria ser impedida de vender ações, ver seus executivos banidos do mercado e receber multas e sanções financeiras muito maiores do que a organização seria capaz de suportar. Litigar nesses casos pode custar à empresa a própria sobrevivência.

No caso da Petrobras, uma questão controversa diz respeito às responsabilidades da presidente da estatal, Graça Foster, e da presidente do Brasil, Dilma Rousseff, ex-presidente do conselho de administração. Ambas dizem que não sabiam de nada. Esse argumento seria acolhido em cortes americanas?

Depende de como as investigações vão evoluir. À luz da lei anticorrupção, o simples fato de ter estado no comando de uma empresa no período em que os crimes foram cometidos, ou de ter falhado em identificá-los, não configura crime. Muitos executivos alegam não saber de nada e saem ilesos. Para que sejam acusados, é preciso provar que tiveram conhecimento do esquema e não o coibiram ou que participaram dele de alguma forma. Por essa razão, o Departamento de Justiça trabalha sempre com o objetivo de conseguir testemunhas, e-mails e documentos.

Funcionários públicos ou políticos que tenham recebido propina no caso Petrobras podem vir a ser punidos nos Estados Unidos?

Essa é uma questão interessante. Ninguém sabe ao certo. Vejo o caso Petrobras como um teste para a lei americana. Ela nasceu para punir os corruptos. Seu texto, porém, não é claro quanto à culpabilidade de quem recebe o dinheiro. A própria Petrobras pode tentar escapar de punições alegando ter sido vítima. O governo americano já desenvolveu várias teses sobre como agir nessas situações, mas até hoje elas não foram postas à prova. Se for mesmo adiante, o caso brasileiro representará uma chance de definir o escopo da lei anticorrupção nos Estados Unidos.

Há outras leis regulando as empresas nos Estados Unidos, como a Sarbanes-Oxley, que pune crimes financeiros e contra o mercado de capitais. A Petrobras e seus executivos podem ser enquadrados nela?

Certamente. É com base nessa lei que os investidores estão processando a Petrobras aqui. Nesse caso, a punição é civil, e não criminal. Pagam-se multas vultosas, mas na prática ninguém tem ido para a cadeia por causa da Sarbanes-Oxley.

Depois de passar por uma investigação desse tipo, como uma empresa consegue se recuperar junto aos investidores?

Ela tem de provar que é digna de confiança e merece uma segunda chance, adotando uma política muito mais severa de controle e de governança.

A Petrobras acaba de criar uma diretoria de governança. É suficiente?

A criação de uma área de fiscalização e governança é uma das providências que o Departamento de Justiça exige de empresas atingidas por escândalos de corrupção. É o mínimo. Existe um manual sobre o que fazer para evitar novos episódios, com uma lista ampla de iniciativas e controles que devem ser adotados para reduzir as vulnerabilidades sobre as quais a corrupção viceja. É preciso aparelhar-se para evitar novos crimes. Não tenho dúvidas de que a Petrobras vai por esse caminho.

A lei anticorrupção americana é considerada eficiente?

É fato que as grandes companhias americanas têm um nível de transparência que não existia quando a lei entrou em vigor, há quase quatro décadas. Graças a ela, a iniciativa de se meter em negócios escusos raramente parte do topo da organização, mas de funcionários menos graduados, da área de vendas ou de escritórios regionais. As empresas refinaram os processos de controle, aprenderam a identificar mais rapidamente os desvios e desenvolveram mecanismos para coibi-los. A lei americana claramente estabeleceu um padrão. Casos como o da Alstom reverberam em todo o ambiente corporativo, fazendo com que executivos mal-intencionados avaliem, antes de se meterem em uma negociata, se seus ganhos superam os riscos de ser pegos.

Quais as maiores fragilidades da lei americana contra a corrupção?

Uma de suas limitações é permitir que o peso das multas recaia sobre os acionistas, já que o dinheiro sai do caixa da empresa, e não do bolso dos executivos culpados. Eles é que deveriam arcar com todas as consequências de seus atos. Outra questão emerge não da lei americana em si, mas de sua comparação com as dos demais países. Existe uma enorme disparidade entre as penas dadas nos Estados Unidos e as adotadas no resto do mundo. Vários países, é verdade, criaram leis mais parecidas com a nossa, que pune fortemente, mas não a ponto de quebrar empresas infratoras. As leis aqui nos Estados Unidos visam a coibir o crime, dando às empresas a chance de reformar seus procedimentos.

A lei anticorrupção brasileira entrou em vigor no ano passado. Em geral, quanto tempo leva para que esse tipo de iniciativa comece a ter impacto?

Não há resultados imediatos. Isso é um fato da vida nesses casos. A lei francesa precisou de uma década para se fazer sentir e provocar uma mudança positiva no ambiente de negócios. A rapidez da transformação no Brasil vai depender de como a lei será aplicada — se para todos ou de forma seletiva. Se valer só para poucos, de nada adiantará, e o resultado desastroso será a perda de respeito por parte da sociedade. Cabe à sociedade mobilizar-se. Parece ingênuo dizer isso, mas um dos fatores que mais impulsionaram a aplicação de leis anticorrupção em muitos países foi a sensação de cansaço, de intolerância da população com a repetição impune desse tipo de crime.

A corrupção é um mal inevitável?

Não vejo assim. O nível de corrupção na Ucrânia, por exemplo, é muito superior ao da Alemanha. Mas não acredito que os ucranianos sejam naturalmente mais corruptos que os alemães. Em qualquer lugar, muitas pessoas são tentadas a ganhar dinheiro de maneira ilegal. O grau de corrupção de um país, porém, dependerá das leis, da sua aplicação e da qualidade das instituições que zelam por elas. O fato de o Brasil ter atualmente casos graves e recorrentes de corrupção é reflexo da falta de uma legislação eficiente e, não se pode esconder, de uma certa cultura de leniência de parte substancial da sociedade.

Que setores são mais expostos à corrupção?

Há uma piada muito repetida entre advogados americanos que resume bem a questão. Perguntam a um famoso assaltante de bancos por que, afinal, ele se especializou em roubar bancos. Ele responde: porque é lá que o dinheiro está. Determinados setores da economia e certos tipos de negócio estão mais sujeitos à corrupção justamente por oferecer recompensas mais altas. De acordo com minha experiência, a indústria do petróleo, com seus lucros fabulosos, é um desses setores mais propensos a abrigar a corrupção. Nesse caso, por depender de concessões, autorizações e licenças do governo. O mesmo se passa com grandes projetos de infraestrutura patrocinados pelo Estado. Onde quer que haja somas vultosas trocando de mãos em negócios que envolvam o Estado e o setor privado, o risco de ocorrer corrupção será alto.

Alguns de seus casos mais famosos acabaram em acordos, como aquele em que, depois de passar anos negando, o ciclista Lance Armstrong confessou ter se dopado. Como se chega è conclusão de que o melhor é capitular?

Não posso falar sobre casos específicos como o de Lance, mas afirmo que essa nunca é uma decisão do advogado. O réu jamais vai agradecer ao encarregado de sua defesa por tê-lo convencido a se declarar culpado. Ele só o faz quando está preparado. É muito pessoal. Eu sempre informo sobre os riscos e exponho claramente as escolhas em jogo. Já houve ocasiões em que o cliente preferiu fazer acordo quando, por mim, eu teria levado o caso a julgamento.

O senhor sabia que Lance Armstrong estava mentindo?

De maneira alguma posso responder a essa pergunta. Posso dizer apenas que enfatizo aos clientes a necessidade de eles me contarem absolutamente tudo.

O criminalista americano Edward Williams dizia: "Defendo meus clientes da culpa legal. O julgamento moral deixo para a majestosa vingança de Deus". Quais são os limites morais do advogado criminal?

Depende de quem você é. Se aceito um caso, é claro que tenho o dever de defender integralmente os interesses do cliente. Nunca julgo meus clientes, mas sigo uma regra quando me pedem para fazer coisas com as quais não concordo ou quando alimentam expectativas de desfecho que não julgo razoáveis. Eu sugiro à pessoa ou à empresa que procure um profissional que possa atendê-la mais de acordo com suas pretensões.

Revista Veja