sábado, 23 de maio de 2015

A TRANSPOSIÇÃO DE ÁGUAS DO RIO SÃO FRANCISCO


Por Evandro Bezerra
Engenheiro agrônomo e diretor social da Associação dos Servidores do Dnocs

A transposição das águas do Rio São Francisco para as bacias carentes do Nordeste setentrional apresenta, ao longo dos seus quase 200 anos, duas histórias: uma institucional e outra relativa às vazões a serem transpostas.
Na série de acontecimentos sociais, políticos e econômicos que englobam a história institucional, vamos bater de frente que ela começou, cronologicamente, em 1818, quando um padre carmelita, João de Santa Rosa, falava da possibilidade de tal transposição e usou a termologia da época de canalização do Rio São Francisco para o Ceará, conhecido como um inédito de Marco Antônio de Macedo, publicado em 1820, o qual foi enviado a D. João VI, rei do Reino Unido de Portugal, Algarves e Brasil, sendo àquela época suplente de deputado federal pelo Ceará.
Em abril de 1821, às vésperas de deixar o Brasil de volta para Portugal, D. João VI teria recomendado ao seu filho, o imperador D.Pedro I, que diligenciasse a fim de verificar a “possibilidade de construção da obra e vantagens de tal empreendimento”. Como não existia por aqueles tempos tecnologia adequada para tal ideia, foi desfeita e caiu no esquecimento com a Confederação do Equador em 1824, movimento separatista ocorrido em várias províncias do Nordeste.
Em 1847-1853, novamente o Dr. Marco Antônio de Macedo, após a sua chegada da Europa, onde fora se atualizar para melhor ajuizar sobre a viabilidade de tal empreendimento, fez várias viagens ao Rio São Francisco, fazendo reconhecimento dos lugares que melhor se prestassem à canalização deste, tendo descoberto Cabrobó, que é o mesmo lugar aventado a 161 anos.
Em 1877-1879, com a seca dos três anos, a transposição volta à tona! Esta seca foi tão violenta que causou elevado número de mortes, onde o município de Mossoró-RN, de uma população de 4.000 habitantes aumentou para 25.000, só pela emigração, em que era comum a morte de pessoas pela fome e pela peste. No Ceará, verificou-se a emigração para Amazônia devido ao ciclo da borracha, chegando a 120.000, de uma população de 800.000 habitantes, em que 500.000 morreram e 180.000 emigraram. Segundo Rodolfo Teófilo, só o obituário de Fortaleza chegou a 63.163 pessoas.
Iniciado o século XX, por volta de 1912, foram realizados os estudos topográficos pela antiga IOCS, Inspetoria de Obras Contra as Secas, e em 1913, esse foi considerado inviável pelo seu primeiro diretor geral, Miguel Arrojado Lisboa. Em 1943, a discussão foi retomada pelo presidente Getúlio Vargas.
Com o início da construção da barragem de Sobradinho, em 1972, e com a sua conclusão e inauguração, em 1980, a transposição volta a ser lembrada, e surge o estudo de previabilidade com uma vazão de 800m3/s e o início da história das vazões de transposição. Essa vazão de 800m3/s teve como base a elevação do nível das águas ocasionado pela formação do lago e, em 13 de maio de 1981, foram publicados os editais de concorrência por iniciativa do Departamento Nacional de Obras Contras as Secas (Dnocs). Nos termos da licitação editada por aquele departamento, os 800m3/s seria das águas durante os 4 meses de cheia do São Francisco juntamente com as águas do Rio Tocantins que daria um volume transposto de 8.294.400.000m3 destinados aos estados do Piauí, 50%, do Ceará, 25%, 25% de Pernambuco, e, 25% restantes para a Paraíba e Rio Grande do Norte. Esse estudo foi realizado no governo João Figueiredo e era ministro do Interior, o coronel Mário Andreazza. Esse estudo caiu depois no esquecimento por vários motivos.
A segunda versão de projeto foi em 1985, no governo José Sarney, também sob a responsabilidade do Dnocs, e previa uma vazão de 300 m3/s, o que daria um volume transposto de 9.460.800.000 m3 de água em um ano.
Por ser a vazão muito elevada, em torno de 15% da modulada pela hidrelétrica de Sobradinho, ela causaria conflitos com os aproveitamentos existentes na própria bacia. Por isso, e por outros argumentos, foi abandonada, e surgiu a terceira versão do projeto que era do antigo Ministério da Integração Regional do governo Itamar Franco, em 1994.  
Previa uma vazão de 180m3/s, que daria um volume transposto de 5.674.480.000m3 de água em um ano. Considerada ainda muito alta, ela causaria defenestramentos no Rio São Francisco e foi trabalhada, então, uma vazão menor de 50 m3/s no Governo FHC que chegou no Governo Lula a 26m3/s com variação de zero a 127m3/s quando esta funcionar a plena carga. Explicado como projeto de garantia hídrica ele teria períodos sem nenhum bombeamento, outros somente com um ou alguns bombeamentos para as bacias receptoras, e, finalmente, situações em que todas necessitarão, concomitantemente, de bombeamentos. Observa-se, hoje, que, mantidos os 26m3/s, fala-se que a transposição seria de modo contínuo.

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