domingo, 9 de novembro de 2025

SOBRE A NOTA DOUTRINAL DO PAPA EM TORNO DE TÍTULOS MARIANOS - Por Barros Alves

                                                                       

O Dicastério para a Doutrina da Fé publicou no dia 4 de novembro uma NOTA DOUTRINAL aprovada pelo Papa Leão XIV, na qual se define alguns limites para a veneração a Maria, Santíssima Virgem, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Salvador. Intitulada “Mater Populi Fidelis” (Mãe do Povo Fiel), o documento, resultante de um longo trabalho colegiado, faz uma releitura de títulos marianos atribuídos por muitos, não exatamente pela Igreja de forma oficial, a Maria, Mãe dos fiéis, Mãe de Cristo e, consequentemente Mãe de Deus (Theotokos), porque Cristo é a segunda pessoa da Santíssima Trindade, no que crêem católicos romanos, ortodoxos orientais e protestantes. Arrimada em fundamentos bíblicos e nas manifestações dos Padres, dos Doutores da Igreja, em harmonia com elementos da tradição oriental e do pensamento dos últimos Pontífices, a Nota dá o tom de como a Igreja deve se comportar em relação à figura de Maria.

Ao longo da história da Igreja os cristãos católicos aprendem a importância da devoção mariana e a cumulam de muitos títulos, que são invocados em todo o mundo, inclusive o de "Medianeira" e "Corredentora". Agora, o documento pontifício considera esses títulos inoportunos e inconvenientes. Todavia, para quem conhece a doutrina católica nada há de novo no front. O título de "Medianeira" sempre pertenceu a Maria como intercessora junto a Jesus Cristo, não junto a Deus-Pai; exatamente porque Jesus, é o único Senhor e Salvador. Títulos tais como “Mãe da graça” e “Medianeira de todas as graças” são aceitáveis dentro dos limites que se jungem à subordinação a Cristo. Essas filigranas teológicas, a rigor, não são alcançadas pela grande massa de fiéis em todo o mundo, até porque a natural tendência das multidões que praticam uma religiosidade popular sempre foi exagerar na devoção e na titulação de Maria.

Em meados dos anos 1990 escrevi um artigo, que foi publicado no jornal O POVO, cujo título é “Maria: o exagero católico e a omissão protestante.” Até parece que os luminares do Vaticano conhecem o pensamento ali exposado. Todavia, levando-se em consideração os posicionamentos de grandes teólogos cristãos ao longo do tempo, tanto católicos quanto protestantes, chega-se à conclusão de que as distorções da religiosidade popular em relação a veneração a Maria foram adubadas pelos pensadores da Igreja. Quem lê os comentários de Martinho Lutero, pai do cisma protestante, sobre o “Magnificat”, o mais belo hino mariano que está no Evangelho de Lucas, entende do que eu estou falando. Roger Schutz, prior de Taizé, ao referir-se à visão de Lutero sobre Maria, escreve que nos primórdios da Reforma não havia esse silêncio sobre a Mãe do Belo Amor nos templos evangélicos/protestantes. “Lutero não teve consciência de uma ruptura com o conjunto da comunidade cristã e muito menos das consequências que vivemos em nossos dias. Ele venerava aquela que foi a primeira a crer em Cristo, a primeira a pronunciar o sim e o amém de um coração fiel, aquela que por virtude do seu consentimento, refletiu em si a perfeição de Cristo.” Com efeito, no “Comentário sobre o Magnificat”. Lutero reflete essa veneração, que no processo histórico foi-se esvaindo no campo protestante até chegar, em determinados casos, a atitudes desrespeitosas e, portanto, heréticas para com a “Theotokos”. O que pode ser compreensível se levarmos em consideração a ignorância dos detratores. 

Voltemos aos títulos marianos em questão e que têm uma história longa e complexa dentro da teologia católica, com nuances entre o uso devocional, teológico e do magistério oficial. A Igreja reconhece Maria como “Mediadora”, mas num sentido subordinado e participativo, nunca como uma mediação “paralela” à de Cristo. Essa história de dizer que os católicos adoram Maria é conversa de gente mal formada e mal informada, que desconhece termos como DULIA (veneração aos santos) e HIPERDULIA (veneração à Nossa Senhora), que se confundem com a adoração ao Deus Filho. O fato de documentos papais muitas vezes exaltarem a plenitude da graça em Maria, não a transforma, no entanto, em substituta de Cristo na economia da salvação. Vale salientar a posição oficial da Igreja, por intermédio do magistério episcopal e papal, sempre resultante de pensamento colegiado:

 

1.      1. Encíclica “Ad Diem Illum Laetissimum”, do Papa São Pio X (1904)

“Ela é a dispensadora de todas as graças que Jesus conquistou com sua morte e seu sangue (...) É por Maria que Jesus nos é dado, e é por Maria que todas as graças nos vêm.” Aqui aparece fortemente a ideia de Maria como Mediadora de todas as graças, mas em tom devocional.

2.      2. Encíclica “Mediator Dei”, do Papa Pio XII (1947)

Embora trate da liturgia, o título reforça que Cristo é o único Mediador, e qualquer mediação mariana é derivada e subordinada à de Cristo.

3. Constituição Dogmática “Lumen Gentium”, documento conciliar. Concílio Vaticano II (1964), n.º 60-62

Este é o documento magisterial é, possivelmente, o mais importante e normativo sobre o tema. Ali se pode ler: “A função maternal de Maria em relação aos homens de modo algum obscurece nem diminui a única mediação de Cristo, mas até manifesta a sua eficácia(...) Por isso a Santíssima Virgem é invocada na Igreja sob os títulos de Advogada, Auxiliadora, Socorro e Mediadora.” Destarte, a “Lumen Gentium” reconhece o título de “Mediadora”, mas adverte que isso não deve ser entendido como uma mediação igual ou paralela à de Cristo, o único Mediador entre Deus e os homens (1Tm 2,5).

Quanto ao título de “Corredentora”, não há uma definição oficial. Trata-se de um uso nascido da devoção do povo católico. A Igreja nunca proclamou oficialmente o título de “Corredentora” como dogma ou definição doutrinal obrigatória. O termo aparece em alguns escritos papais e teológicos, mas sempre em sentido analógico (participação subordinada de Maria na obra redentora de Cristo), nunca em sentido dogmático pleno. Importante lembrar que declarações meramente devocionais não devem ser confundidas com documentos oficiais ou decisões dogmáticas da Igreja. Vejamos algumas manifestações de natureza pessoal de importantes líderes espirituais da Igreja Católica:

1.  O Papa Pio XI usou o termo “Corredentora” em discursos públicos (por exemplo, em 1933 e 1935):“A Santíssima Virgem foi associada à obra da redenção como Corredentora.” Veja-se que a manifestação não foi feita em documento dogmático ou encíclica, mas apenas em alocuções e discursos.

 O Papa São João Paulo II empregou o termo “Corredentora” algumas vezes, mas em discursos (não em documentos magisteriais: “Maria foi, de modo particular, associada à obra redentora de seu Filho(...) podemos chamá-la de Corredentora.” (Discurso, 6 de fevereiro de 1985). Contudo, João Paulo II não propôs esse título como dogma, e inclusive reforçou a unicidade da redenção em Cristo.

O Papa Francisco, menos mariano, advertiu contra o uso excessivo do termo: “Cristo é o único redentor. As expressões de Maria como "Corredentora" ou "Mediadora" às vezes podem ser mal interpretadas.” (Homilia, 12 de dezembro de 2019)

Enfim, a Igreja tem ensinado oficialmente que Maria participa da mediação de Cristo (Mediadora subordinada); coopera com a redenção (Corredentora, em sentido analógico, não dogmático); Mas Cristo é o único Mediador e Redentor, ou seja, Maria participa dessa obra de modo derivado e instrumental. Portanto, as orientações publicadas pelo Dicastério para a Doutrina da Fé, publicada com o aval do Papa Leão XIV, deixou ouriçados apenas os não católicos e/ou católicos que não conhecem os documentos do magistério da Igreja Católica. Voltaremos ao tema.

 

terça-feira, 4 de novembro de 2025

HISTÓRIA DE SANTO ANTÔNIO DO QUIXERAMOBIM E A PIEDOSA DEVOÇÃO DO CAPITÃO ANTÔNIO DIAS FERREIRA E DO PREFEITO CIRILO PIMENTA - Por Barros Alves

                                                                             

 

Salve meu Padrinho Ciço! 

E Meu Senhor do Bonfim!!!

Dai-me alta inspiração 

Santa Ana e São Joaquim,

Para que eu faça um roteiro

Da vida do padroeiro

Do meu Quixeramobim.

 

Quero contar ao leitor

Com minha pena certeira

Como a história começou 

Tudo da melhor maneira.

Começou com um cidadão 

Cheio de fé e devoção:

ANTÔNIO DIAS FERREIRA.

 

Esse nobre cavalheiro

Veio parar no sertão,

Homem de muita riqueza,

Muita fé e oração.

Aqui montou sua tenda

E comprou grande fazenda:

SANTO ANTÔNIO DO BOQUEIRÃO.

 

Fazenda de muitas terras,

A maior desse lugar.

Antônio Dias Ferreira

Começou a prosperar

Mesmo cheio de dinheiro 

Preferiu ficar solteiro

E nunca quis se casar.

  

Dizem que Antônio Ferreira

Jovem e nobre capitão 

Desistiu de casamento

Por uma decepção 

E ante esse ato falho 

Dedicou-se ele ao trabalho,

Também a religião

 

Era um jovem de coragem,

De ousadia e vigor,

Respeitoso e diligente,

Pronto pra fazer favor.

Antônio Dias Ferreira 

Era figura altaneira,

Um cidadão de valor.

 

O que estou a contar

Não tem nada de balela,

São fatos muito importantes

Que nossa história revela.

Pois o bravo capitão 

Vivia na solidão

Lhe faltava uma donzela.

 

Um dia na Casa Grande

Já à noite em alta hora

Antônio pediu a Deus

Uma esposa, sem demora.

Porém, Deus disse a Antônio:

-- “Vou fazer seu matrimônio 

Com a Virgem Nossa Senhora.”

 

Antônio no mesmo instante

Fez voto de castidade,

Prometeu morrer solteiro 

Praticando a caridade.

O que digo não é lenda,

Aos escravos da fazenda 

Concedeu a liberdade.

  

E tendo na sua mente

A imagem da Virgem Bela

Nossa Senhora Santíssima

Por quem Cristo, o filho, vela,

Resolveu pedir licença 

Ao bispo, e firmou a crença, 

Construindo uma capela.

 

E com muita reverência 

Nosso bravo capitão

Foi ao Mosteiro de Olinda,

Solicitar capelão,

Para com autoridade

Trazer ao povo a Verdade

Da Santa Religião. 

 

Era Dom José Fialho

Bispo de grande visão

Era o prior de Olinda

Bom pastor da região,

Ouviu e compreendeu

E ao capitão concedeu

Logo a autorização.

 

Antônio juntou o nome

Do santo de devoção 

Ao nome de sua fazenda

Em sinal de gratidão.

-- “Para que o povo entenda,

Agora o nome é Fazenda 

SANTO ANTÔNIO DO BOQUEIRÃO”.

 

Porém, para conseguir

Essas promessas sagradas,

Construir a capelinha

Com imagens consagradas

O capitão, numa serra,

Deu “meia légua de terra

E trinta vacas situadas.”

  

Foi um presente à Igreja

E à Virgem de Nazaré,

Bem antes da devoção

Ao Santo de Canindé.

Capitão Dias Ferreira

Não era de brincadeira,

Mas, muito firme na fé.

 

Foi Santo Antônio escolhido

O patrono principal

Não porque o capitão

Tivesse seu nome igual,

Mas porque dentro dos planos

Ambos eram franciscanos,

Seguiam o mesmo ideal.

 

Santo Antônio de Lisboa

Foi Fernando batizado

Com sobrenome Bulhões,

Filho de rico abastado.

Trocou tudo pela Cruz

Seguiu o Senhor Jesus,

Depois foi santificado.

 

Depois seguiu para a Itália

E em Pádua fez morada,

Como grande pregador

Percorreu uma longa estrada.

E por sua santidade

Seu nome em cada cidade

É uma marca registrada.

 

Teve o dom da ubiquidade

Dom de ao mesmo tempo estar

Pregando ele a Palavra

De Deus em mais de um lugar,

Em Pádua e em Portugal

Por mercê celestial

Antônio estava a pregar.

 

Daí Santo Antônio de Pádua

Ser o mesmo de Lisboa

Tanto ontem como hoje

A sua voz sempre ecoa

Contra hereges e ateus

Ele era a voz de Deus

Perdoando a quem perdoa.

 

Nas camadas populares

É santo casamenteiro,

Mas, não casou o capitão

Que permaneceu solteiro.

Tu, ó Santo, nos proteges

És MARTELO DOS HEREGES

Teu apelido primeiro.

                                                                                


Depois de compridos anos

A capela arruinou-se,

Toda sua construção

Por fim deteriorou-se.

E apesar da trabalheira

Capitão Dias Ferreira

Muito ele preocupou-se.

 

Voltou ao bispo de Olinda

Para pedir permissão

A Dom Xavier Aranha,

Oitavo na sucessão.

E desta vez sua peleja

Era construir a Igreja

Com uma maior dimensão.

  

Vendo que o solicitante

Tinha fortuna avultada,

A construção da Igreja

Logo foi autorizada.

E tudo começou assim

Surgiu Quixeramobim

Da Santa Igreja Sagrada.

 

Santo Antônio lá no Céu

Tocou logo o seu clarim,

Na Fazenda Boqueirão

Não havia nada ruim

Sem lugar para o demônio

Nasceu ali SANTO ANTÔNIO

DO meu QUIXERAMOBIM.

 

A Igreja nasceu linda,

Vasta, bela, decorada,

Onde está a água benta

E a hóstia consagrada.

Depois da inauguração

Com bênção e consagração

Ali Deus fez a morada.

 

Padre Maciel Carvalho

Foi primeiro capelão

Depois os padres José

Bernardo Fonseca Galvão,

Pedro Araújo da Rocha

No coração uma tocha

De amor e dedicação.

 

Antes cuidou do rebanho

Francisco Sales Gurjão.

José Camelo Pessoa

Foi padre de grande ação,

Ele era uma alma boa,

Não fazia nada à toa,

Um perfeito cidadão.

 

José Pereira de Castro,

Manuel Rodrigues de Freitas

Também foram capelães

E figuras bem aceitas.

Francisco Xavier da Cunha,

E Xavier de Sousa se impunha,

Duas vidas escorreitas.

 

Esses foram pioneiros

Que levaram vida dura,

Por esses sertões adustos

De pobreza, sem fartura.

Outro viveu esse sonho

Se chamava Frei Antônio

Sobrenome Boaventura.

 

Muitos outros sacerdotes

Na seara de Jesus

Realizaram a missão

Carregando sua cruz

Cá em Quixeramobim,

Convertendo a gente ruim

E trazendo-os para a luz.

 

Padre Anderson Clay de Souza

É o pároco atual

Que cuida de todo povo

Com a bênção sacerdotal,

Pra nos livrar do demônio

Ele roga a Santo Antônio

Sua bênção especial.

 

Para auxiliar o pároco

Temos da Congregação

Lazarista, o Padre Nairon,

Homem de fé e oração.

Aos primeiros outro se some,

Não se perde pelo nome:

Djedje Joaquim Garrafão.

 

A capela foi guindada

Logo a Igreja Matriz,

Com Santo Antônio patrono

Deixou o povo feliz.

E a nossa população

Com a sua devoção

É a grande força-motriz.

 

Desde o século dezoito

Há quase trezentos anos

O quixeramobinense

Só passa por desenganos

Se não pede a Santo Antônio

Pra guardar seu patrimônio

E realizar seus planos.

 

Junho, mês de Santo Antônio

Temos grandiosa festa,

Quem não veio perdeu muito,

Quem já veio viu e atesta:

Em nossa Quixeramobim

Não existe tempo ruim,

É terra de gente honesta.

 

A nossa população

Sempre educada e atenta,

Não tem conversa fiada

Não aumenta nem inventa.

E guardando o patrimônio

Lá em cima Santo Antônio

E aqui Cirilo Pimenta.

 

Diante do que foi posto

E que foi contado a mim,

Pelo que li na história

Eu posso afirmar assim:

- Da Europa desistiu,

Santo Antônio preferiu

Vir pra Quixeramobim.

 

No meu Quixeramobim

O sertão tem poesia,

Mora um povo de fé firme,

Que em junho se contagia,

Pois o Santo Padroeiro

Traz devoto e traz romeiro

Em sagrada romaria

 

Dr. Cirilo Pimenta,

Temente a Deus e cristão,

É fervoroso e devoto

E conserva a tradição.

Pelo povo sempre eleito

Ele é o melhor prefeito

Das cidades do sertão.

 

Cuida da Igreja Matriz,

Do altar, do sino antigo,

Pois venera Santo Antônio

E tem nele um grande amigo.

Seu caráter não se altera

Uma fé firme e sincera

Carrega sempre consigo.

  

Quando chega o mês junino

De Santo Antônio e São João,

Dr. Cirilo faz guia

Da mais bela procissão,

Junto com o senhor vigário

Levando a cruz e o sacrário,

Vão guiando a multidão.

 

As ruas brilham de enfeite,

As praças, grande alegria,

A Banda toca festiva,

A fé vira melodia.

No meu Quixeramobim

Todo ano é sempre assim,

E Santo Antônio alumia.

 

Segue Quixeramobim

Com seu líder devotado

Que honra o nome do santo

Com zelo e amor redobrado

Dr. Cirilo Pimenta

É um exemplo que alimenta

Nosso povo abençoado.

 

Meus quixeramobinenses, 

Vamos sempre renovar

Devoção a Santo Antônio

Que abençoa este lugar.

Com Deus, Jesus e Maria

Agradeço a cada dia

Poder isto versejar.

 

Meu querido Santo Antônio

Que a minha fé aumenta,

Tudo aquilo que eu escrevo

Da Verdade se alimenta.

Viva Santo Antônio amado!

E Jesus crucificado!

Viva Cirilo Pimenta!

 



domingo, 2 de novembro de 2025

Ontem todos os santos, hoje todos os mortos.

Barros Alves

Ontem, a Igreja Catolica celebrou em todas as paróquias do planeta, a Festa de Todos os Santos, lembrança litúrgica anualmente rememorada em 1º de novembro, no Calendário Gregoriano. Trata-se de uma das solenidades mais antigas e importantes do calendário católico.  Tem como objetivo honrar todos os santos e santas, conhecidos ou anônimos, que alcançaram a glória do Céu e participam da comunhão dos santos.

A devoção aos santos remonta aos primeiros séculos do cristianismo, quando as comunidades celebravam a memória dos mártires, homens e mulheres que deram a vida pela fé. Com o passar do tempo, o número de mártires cresceu tanto que se tornou impossível dedicar um dia específico a cada um. Surgiu, então, a ideia de uma festa comum para todos os santos.

Acredita-se que o primeiro registro dessa celebração tenha ocorrido em Antioquia, no século IV. No entanto, foi em Roma que a festa ganhou caráter universal. O Papa Bonifácio IV, por volta de  609 ou 610 a.D, consagrou o antigo Panteão romano, um  templo dedicado a todos os deuses, à Virgem Maria e a todos os mártires, instituindo o dia 13 de maio como data da comemoração.

Mais tarde, no século IX, o Papa Gregório IV transferiu a festa para o 1º de novembro, provavelmente para coincidir com antigas celebrações agrícolas europeias, transformando-as num louvor cristão à colheita espiritual dos santos. A partir daí, o dia passou a ser observado por toda a Igreja do Ocidente.

O Dia de Todos os Santos foi declarado dia santo de guarda, ou seja, data em que os fiéis são convidados a participar da Santa Missa e a suspender trabalhos servís, dedicando o tempo à oração e à contemplação do exemplo dos santos. O Papa Urbano IV e, mais tarde, Papa Sixto IV, reforçaram a importância da solenidade e incentivaram a veneração conjunta dos santos como expressão da unidade do Corpo Místico de Cristo.

O Concílio Vaticano II (1962–1965), ao falar da vocação universal à santidade na constituição "Lumen Gentium", reafirmou o sentido profundo desta festa: todos os batizados são chamados à santidade, não apenas alguns escolhidos.

Celebrar Todos os Santos é celebrar a vitória da graça de Deus na vida humana. É um convite à esperança, pois mostra que a santidade é possível em todas as condições de vida. Como afirmou São João Paulo II, “a solenidade de Todos os Santos recorda-nos que a Igreja é essencialmente comunhão de santos, e que cada fiel é chamado a essa comunhão”.

Assim, a festa é, ao mesmo tempo, memória, louvor e compromisso: memória dos que já alcançaram o Céu, louvor a Deus que opera maravilhas em seus servos e compromisso de seguir o mesmo caminho de amor e fidelidade.

Portanto, importa afirmar que a Festa de Todos os Santos une a Igreja da Terra, a do Céu e a do Purgatório num só cântico de glória, reafirmando a comunhão dos santos e o chamado universal à santidade que atravessa os séculos e permanece atual em cada geração cristã.


A celebração de Todos os Santos antecede a que honra a memória dos Fiéis Defuntos, celebrada pela Igreja Católica no dia 2 de novembro, e constitui uma das expressões mais belas da fé cristã na comunhão dos santos e na esperança da ressurreição. Popularmente conhecida como Dia de Finados, esta data convida os fiéis a rezarem por todos os que já partiram desta vida, especialmente pelas almas do purgatório.

A prática de rezar pelos mortos remonta aos primeiros séculos do cristianismo e tem raízes bíblicas, como no livro dos Macabeus (2Mc 12,44-46), onde se afirma que “é um santo e salutar pensamento rezar pelos mortos, para que sejam livres de seus pecados”. Os cristãos primitivos celebravam a Eucaristia sobre os túmulos dos mártires, pedindo a Deus que os recebesse em Sua glória e intercedessem pelos vivos.

A instituição de uma data específica para a comemoração de todos os fiéis defuntos deve-se ao abade São Odilon de Cluny (†1049), que, no ano 998, ordenou que em todos os mosteiros beneditinos ligados a Cluny se celebrasse, no dia seguinte à Festa de Todos os Santos, uma missa e orações pelos mortos. Essa prática se difundiu rapidamente por toda a cristandade, sendo adotada em Roma por volta do século XIII.

O Dia de Finados não é um dia santo de guarda no sentido canônico, ou seja, não é de preceito obrigatório, mas a Igreja sempre incentivou fortemente sua observância devota. A tradição de visitar os cemitérios, acender velas e rezar pelos falecidos expressa a fé no poder da oração e dos sufrágios em favor das almas do purgatório.

O Papa Leão XIII (século XIX) escreveu sobre a necessidade de rezar pelos mortos, lembrando que “a caridade cristã não se limita à terra, mas se estende ao além-túmulo”. Já o Papa Bento XV, em 1915, concedeu aos sacerdotes o privilégio de celebrar três missas no Dia de Finados: uma pela intenção de todos os fiéis defuntos, outra pelo Papa e outra conforme a intenção do celebrante, privilégio que permanece até hoje.

Mais recentemente, o Papa João Paulo II e o Papa Francisco destacaram o caráter de esperança da celebração. João Paulo II afirmava que “rezar pelos defuntos é reconhecer que o amor é mais forte que a morte”, enquanto Francisco recorda que “a memória dos mortos renova em nós a certeza de que ninguém está perdido para para sempre." 

A celebração dos Fiéis Defuntos está profundamente ligada à fé na ressurreição de Cristo. Ao rezar pelos mortos, os fiéis testemunham que a morte não é o fim, mas uma passagem para a vida eterna. A Igreja, unida em oração, intercede para que as almas em purificação sejam acolhidas na visão beatífica de Deus. 

Além disso, a data ensina que a vida deve ser vivida na perspectiva da eternidade. O Catecismo da Igreja Católica (n. 1032) reafirma que “desde os primeiros tempos, a Igreja honra a memória dos defuntos e oferece sufrágios em seu favor, sobretudo o sacrifício eucarístico”. O Dia de Finados é, portanto, uma celebração de fé, caridade e esperança. Ao lembrar e rezar pelos falecidos, a Igreja reafirma a comunhão que une os vivos e os mortos em Cristo, e proclama a certeza de que “se morremos com Ele, com Ele viveremos” (2Tm 2,11). É um convite a contemplar o mistério da vida eterna e a viver cada dia com o olhar voltado para Deus, Senhor da vida e da morte.

segunda-feira, 27 de outubro de 2025

"Púlpito não é palanque" – Por Barros Alves

                                                                                

A realização de um ato político na Catedral da Sé, em São Paulo, para lembrar os 50 anos da morte de Vladimir Herzog, reveste-se de um significado profundamente preocupante. E sob a ótica da fé católica, de caráter sacrílego. A casa de Deus é um espaço consagrado à oração, à celebração dos sacramentos e ao encontro do homem com o transcendente. Converter o altar, lugar do sacrifício eucarístico, em tribuna política é um desrespeito à sacralidade do templo e uma deturpação de sua finalidade espiritual.

A Igreja Católica, ao longo dos séculos, sempre se pautou pela defesa da dignidade humana, dos pobres e da justiça social. Mas, essa missão evangélica jamais pode ser confundida com militância ideológica. O Evangelho é libertador não porque se insere em correntes políticas, mas porque transcende todas elas. A caridade cristã não é um instrumento de propaganda; é um testemunho silencioso e eficaz da presença de Cristo no mundo.

A instrumentalização da Catedral da Sé de São Paulo, um dos símbolos maiores da fé católica no Brasil, para fins partidários ou ideológicos é um desvio da sua vocação. O púlpito sagrado não é palanque político, e o altar, onde se renova o sacrifício de Cristo, não pode servir de cenário para discursos humanos marcados por divisões e paixões temporais. A liturgia é um espaço de comunhão universal, não de disputa entre grupos ou visões de mundo.

A lembrança de Vladimir Herzog, personagem trágico da história brasileira, pode e deve ser tratada com respeito e reflexão. Mas, há lugares e modos apropriados para isso - centros culturais, auditórios, espaços públicos - e não o interior de uma igreja consagrada. Quando a fé se mistura à política partidária, ambos os campos saem empobrecidos: a religião perde sua força espiritual e a política perde sua legitimidade ética. Cabe à Igreja reafirmar sua missão universal de anunciar o Evangelho, promover a reconciliação e ser instrumento de paz. Isso exige prudência, discernimento e fidelidade ao seu papel sobrenatural. Transformar o templo em palco político é profanar o que há de mais sagrado e trair a confiança dos fiéis que buscam ali a presença do Deus vivo, e não a retórica dos homens.

Em tempos de polarização e confusão de valores, é preciso recordar que a Igreja pertence a Cristo, não a partidos, ideologias ou correntes de pensamento. Sua autoridade moral nasce da coerência com o Evangelho, não da adesão a causas políticas. Por isso, todo gesto que dilua essa fronteira constitui não apenas um erro pastoral, mas um verdadeiro sacrilégio. A Catedral deve continuar sendo o coração espiritual de São Paulo, lugar de oração, silêncio e comunhão, e não cenário de disputas humanas. O altar é de Cristo e só a Ele pertence.

"O trágico fim de Pinto Madeira, o amigo do rei" - Barros Alves

                                                                               

Há alguns meses recebi um presente daqueles que muito me agradam. O editor e bibliófilo Adriano de Carvalho Duarte, agradou-me sobremodo ao colocar em minhas mãos um exemplar de obra biográfica que não pode passar sem um breve comentário. Trata-se do livro “O amigo do rei: julgamento e assassinato de Joaquim Pinto Madeira”, uma vigorosa reconstrução histórica e literária de um dos episódios mais sombrios e reveladores do Império brasileiro: a revolta e o fuzilamento do coronel cearense Joaquim Pinto Madeira, em 1834. A obra, ao entrelaçar narrativa documental e reflexão crítica, devolve voz a uma personagem por muito tempo marginalizada pela historiografia oficial e pela memória nacional, até mesmo na região teatro dos fatos dos quais ele foi protagonista. Em Fortaleza há uma rua com o nome dele, mas que um pouco conhecido Torres Câmara abocanhou-lhe mais da metade.

O autor desse excelente estudo ensaio biográfico é o advogado Heitor Feitosa, também historiador perspicaz e investigador de fatos passados dotado de faro felino. Ele já presidiu o Instituto Cultural do Cariri-ICC, e se firma como escritor de nomeada. Para construir a biografia de Pinto Madeira, Heitor Feitosa empreendeu pesquisa rigorosa à qual adicionou uma  linguagem envolvente, que não se limita apenas a recontar a sequência de fatos que levaram Pinto Madeira do prestígio de líder regional ao suplício da execução pública. Ele investiga, sobretudo, o ambiente político e moral do Ceará e do Brasil nas primeiras décadas do século XIX, marcadas por instabilidade, lutas de poder e a tensão entre o centralismo monárquico e as aspirações autonomistas das províncias.

Decerto não erraremos se afirmarmos que “O amigo do rei”, carrega ironia e densidade simbólica. Pinto Madeira, monarquista convicto e defensor da restauração absolutista, acreditava lutar pela ordem e pela fidelidade ao trono. Porém, foi traído pela própria monarquia que pretendia proteger. Seu destino trágico, transformado em espetáculo de punição, revela as contradições do Império nascente e o caráter seletivo da justiça de então. Até parece que no Brasil de hoje a história se repete. E, por agora, como farsa e como tragédia. Ou mesmo, em face do que vemos em altas cortes, repete-se como tragicomédia.
Mas, voltemos à vaca fria. O mérito maior do livro está na maneira como o autor consegue conciliar rigor histórico e sensibilidade narrativa. Os autos do processo, as cartas, as crônicas da época e os depoimentos se transformam em matéria literária, sem perder a fidelidade documental. A escrita é sóbria, mas ao mesmo tempo carregada de indignação moral, uma indignação que não é panfletária, e sim humanista. Pinto Madeira surge como uma figura complexa: herói para uns, traidor para outros, e, acima de tudo, vítima das forças políticas que esmagavam indivíduos em nome da ordem.
Além do interesse histórico, a obra propõe uma reflexão sobre o uso do poder e a manipulação da justiça, temas que atravessam o tempo e encontram ressonância no presente. Ao revisitar o julgamento e o assassinato de Pinto Madeira, o autor questiona como a memória oficial é construída e como certos episódios são silenciados por não se encaixarem nas narrativas triunfalistas da nação sob a vontade efêmera de governos que se autoinvestem de proprietários do Estado e  do próprio povo.
Enfim, em modesto entendimento, o livro de Heitor Feitosa é mais do que uma biografia trágica de uma personagem dotada de ímpar idealismo; a obra configura uma meditação sobre o Brasil e suas repetições históricas. A leitura deixa no leitor uma sensação amarga e lúcida: a de que, em muitas épocas, a lealdade e a coragem podem ser recompensadas com a morte; e que o poder, disfarçado de justiça, continua sendo um dos grandes dramas de nossa história política.


"Ciro Gomes para unir o Ceará e restaurar a confiança na política" - Por Barros Alves

                                                                        

O ex-governador Ciro Gomes retornou ao PSDB depois de uma trajetória partidária conflituosa. Retornou à casa paterna. E por força das circunstâncias, avalizado - diria mesmo convocado - para ser candidato novamente ao governo do Ceará. E sem se desvestir da condição e das responsabilidades como liderança de expressão nacional. Nosso Estado vive um momento decisivo de sua história política. As forças que moldaram o Estado nas últimas décadas encontram-se fragmentadas, e o sentimento de descrença cresce entre os cidadãos diante de escândalos de corrupção e da falta de lideranças firmes e coerentes. Nesse cenário, o nome de Ciro Gomes ressurge com vigor e pertinência como uma alternativa capaz de restabelecer a confiança do povo e de unir os diversos segmentos políticos em torno de um projeto sólido, ético e voltado ao desenvolvimento do Estado.
Ciro é, indiscutivelmente, um dos homens públicos mais preparados do país. Com uma trajetória que inclui o governo do Ceará, o Ministério da Fazenda, o Ministério da Integração Nacional e uma destacada atuação parlamentar, ele reúne experiência administrativa, descortino político e visão estratégica, cabedal raro na política brasileira contemporânea. Sua capacidade de planejamento e sua postura de independência fazem dele um líder que transcende fronteiras ideológicas e partidárias.
Enquanto muitos dos nomes que hoje se colocam no campo da situação carregam acusações e condenações por corrupção, Ciro preserva uma biografia limpa, pautada pela coerência e pela defesa do interesse público. Esse diferencial ético o credencia como o contraponto mais legítimo à oposição e às práticas que corroem a credibilidade da política. O povo cearense reconhece nele não apenas o gestor eficiente, mas o homem de princípios que sempre manteve altivez diante das pressões do poder e das conveniências eleitorais.
Sua forte personalidade, que em outros tempos foi vista como traço de temperamento explosivo, hoje se revela uma virtude. Num ambiente político marcado pela apatia e pela omissão, o vigor e a franqueza de Ciro inspiram confiança. A população percebe nele a figura do líder que fala o que pensa, age com convicção e não se dobra aos interesses escusos que tantas vezes mancharam a vida pública nacional.
Além disso, lideranças respeitadas, como o ex-governador Tasso Jereissati, reconhecem a importância de Ciro Gomes reassumir o comando do Ceará. A convergência entre essas duas figuras emblemáticas da política cearense é um sinal de maturidade e de responsabilidade histórica. Ambos compreendem que, mais do que uma disputa eleitoral, o que está em jogo é o futuro do Ceará, a retomada de um projeto de Estado moderno, justo e eficiente.
Ciro Gomes reúne, portanto, todas as condições para conduzir o Ceará a um novo ciclo de progresso e de credibilidade política. Sua volta ao governo representaria não apenas o resgate de uma liderança, mas a reafirmação dos valores éticos, da competência administrativa e da coragem moral que o povo cearense tanto anseia. Num tempo de incertezas e desencantos, o nome de Ciro surge como símbolo de esperança e de reconstrução. O Ceará precisa de Ciro Gomes. E o Brasil precisa, mais uma vez, olhar para o Ceará como exemplo de política séria, corajosa e transformadora.

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