terça-feira, 16 de novembro de 2010

Apresentando o livro ATO DE EDUCAR











Transcrevo o discurso que pronunciei por ocasião do lançamento do livro ATO DE EDUCAR, de autoria do Professor Pio Barbosa Neto, no dia 10 do mês fluente, em solenidade realizada no Auditório Murilo Aguiar, da Assembleia Legislativa do Ceará.


"A aceleração das transformações do mundo e da sociedade, das formas de organização social, da tecnologia e meios de comunicação e das estruturas materiais, vem imprimindo mudanças vertiginosas nos modos de construção do conhecimento, do pensar, do agir e dos próprios valores que norteiam a formação do homem no cenário vida hodierna. Essas alterações ocorrem de maneira inaudita tanto em nível de rapidez quanto em profundidade e abalam os contextos sociais e as instituições, aí assomando significativamente a influência determinante nos caminhos da instituição educativa que vem sentindo esses reflexos e vivendo conflitos nunca dantes imaginados.

"Neste cenário, os conhecimentos, os saberes e a própria educação não se configuram mais como um patrimônio exclusivo das instituições escolares. A comunidade dispõe de diferentes meios e modelos para apreender e produzir conhecimento científico, cultural etc. Aí estão, por exemplo, à disposição de todos, as imensas e fantásticas possibilidades apresentadas pelas redes multimídias que a cada dia e de forma meteórica virtualizam a vida e estreitam relações entre culturas as mais díspares.

A inexorabilidade desse fato social, se por um lado propicia-nos um conjunto de estruturas que permitem o desenvolvimento de ações e reflexões potencialmente favoráveis ao crescimento espiritual, por outro deixam-nos à mercê de uma liberdade que coloca o homem diante de uma situação kafkiana em que as astúcias do cotidiano criam táticas desviacionistas, para lembrar Michel de Certeau, as quais em vez de lhe conquistar para o empreendimento utópico de uma sociedade solidária, ao contrário empurra-o a mais das vezes para uma sociedade de solitários, onde a multidão que cerca o indivíduo não passa de uma invenção amorfa de pseudo-homogeneidade social.

"Essa situação nos remete à angústia do filósofo espanhol Ortega y Gasset, que há muito já identificava que “o homem está hoje, lá dentro de si, espantado precisamente pela consciência de sua principal ilimitação. E, por acaso, isso contribui para que ele não saiba, agora, quem é – porque ao achar-se, em princípio, capaz de ser tudo o que imaginar, já não sabe o que efetivamente é”. Esse o preço que o homem paga por se ter tornado uma espécie de homo tecnologicus. Não que o progresso da técnica invalide a caminhada da humanidade ao Olimpo das supremas descobertas. Mas, porque a sua capacidade de descoberta – insisto no pensamento de Gasset – “em princípio ilimitada, faz com que o homem esvazie sua vida, posto que vive com fé na técnica e só nela (...) Em si cheia de possibilidades, a técnica é mera forma oca – como a mais formalista lógica - é incapaz de determinar o conteúdo da vida”.

"Daí a importância da educação para a vida, uma educação que preencha os vazios e alargue os mistérios da transcendentalidade no ser humano, que dissemine valores da erternidade do homem pensado por Chesterton, ainda que sejamos humanos, demasiadamente humanos, segundo Nietzsche, aquele que heretica e equivocadamente decretou em sua filosofia desatinada a morte de Deus. Somente arrimados num gesto em que não se olvide a importância da Transcendência, podemos ultrapassar as fronteiras rígidas e enganosas de concepções tidas por humanistas, as quais, no entanto, não passam de armadilhas que a longo prazo levam à aridez do espírito humano.

"Por pertinente, recorro à voz de um dos mais abalizados pensadores católicos de todos os tempos neste país, o Professor Gustavo Corção, tão olvidado quanto injustiçado pelo agnosticismo acadêmico ao longo dos últimos 40 anos. O velho Quixote ultramontano ensina que a educação tecnicista que abominamos não é aquela das máquinas ou dos aparelhos elétricos; não é aquela que permite o gosto e a admiração pelo progresso técnico. O que Corção condena como tecnicismo “é a transplantação dos métodos, do critério e do estilo, que são próprios da técnica, que são a sua coroa, para os domínios da vida moral. É a ilusão de resolver os problemas da vida humana como se resolve um problema de linha de transmissão”. Com efeito, entendo que a imposição de discursos que se fundamentam essencialmente na Ciência sem a Transcendência eiva-se intrinsecamente de natural deficiência.

"Daí, igualmente o catalão Octavio Fullat, partilho a ideia um tanto pessimista, mas bem própria para os dias atuais em que Deus anda distante dos nossos sistemas educacionais, de que “No nosso mundo resulta quase impossível educar. A condição desprivilegiada da educação modificou-se de pronto. Colocar o outro na presença do Ser Supremo é um trabalho de cara para a História e não de costas para o tempo; é um trabalho concreto, não mágico. Conduzir o educando em direção ao Criador, para a plenitude, deve ser uma realização dentro da História.”

"E, peremptoriamente, Fullat assevera com proficiência: “O educador deve ser um descobridor de Deus a quem o coloca adiante; o educador descobrirá Deus (...) O educador cristão que não defenda a individualidade contra o espírito de massa não vive o momento e realiza, por ignorância, uma tarefa nula, porque a mensagem evangélica se dirige à pessoa e não a massas humanas”.

"Eis que a fala do pedagogo catalão conduz-nos à escritura proverbial, a qual no Livro dos livros ensina que “o temor de Deus é o princípio da sabedoria”.
Fullat quer uma educação com a permanente presença do Divino. Assim o aprecio, assim o admiro. E, pelo que conheço do Professor Pio Barbosa Neto, assim também pensa ele, que hoje nos presenteia com este Ato de Educar, uma obra significativa tanto do ponto de vista pedagógico quanto do filosófico, posto que o autor arrimou-se em ampla e qualificada bibliografia para sistematizar um trabalho que desentranha com vigor o verdadeiro papel da educação na sociedade, arrolando pensadores e seus pensares para esclarecer, conscientizar, orientar e edificar.

"Ao lançar ao leitor um panorama analítico e conceitual dos aspectos histórico-sociais da Pedagogia, Pio Barbosa Neto fornece-nos instrumentos para a compreensão de teorias educacionais assimiladas ou não ao longo do tempo, e pragmatizadas em processos de aprendizagem que contribuíram e/ou contribuem para melhorar a vida das pessoas em nosso planeta.

"Quanto a nós, brasileiros, livros iguais a este são muito mais bem-vindos, posto que ainda soa dolorosamente atual a afirmação do grande educador Darcy Ribeiro: “No Brasil, o espantoso é que há uma cegueira generalizada das camadas mais influentes com respeito à nossa realidade educacional. É possível, até, afirmar que uma das características remarcantes da sociedade brasileira é sua resignação com a péssima escola que temos. Ninguém estranha que ela seja tão ineficiente. Ninguém se exalta diante do pouco esforço que ela faz para superar-se”.

"O Professor Teodoro Soares, deputado com assento nesta Casa e igualmente educador de nomeada, eleva sua voz irredenta em defesa desses postulados que visam a melhoria da educação em nosso país. Na condição de ex-reitor de duas universidades e, portanto, profundo conhecedor da constrangedora situação educacional em que vivemos, ele diz: “O povo brasileiro, o nordestino e o cearense chegaram ao limite da tolerância. Um país que se diz e pretende ser democrático, em que todos os cidadãos devem ter os mesmos direitos, não pode permitir que esta situação perdure por muito tempo, sob pena de postergar para o futuro, seu desenvolvimento e bem estar dos seus filhos.”

"Tenho plena certeza de que se Darcy Ribeiro aqui estivesse faria coro comigo: o livro de Pio Barbosa é uma dessas obras que de modo concreto e decisivo constitui precioso contributo para melhorar a educação no Ceará e no Brasil.

"Caríssimo amigo Pio, ao tempo em que lhe dou parabéns pela empreitada, faço-o comovido porque, sabedor do seu talento e disciplina, sei também que este livro resulta de intensa labuta intelectual e, certamente, de um ingente esforço editorial para que o filho dileto viesse à luz.

"A você os meus mais efusivos e sinceros aplausos.
Muito obrigado a todos."

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