Ministro Nelson Hungria
Barros Alves
A Assembleia Legislativa do Ceará aprovou pela quase unanimidade de seus
pares (apenas duas divergências) Mensagem do Governo do Estado na qual se define
remissão de penas imputadas a condenados mediante a leitura de livros. O
projeto aprovado pelo Parlamento cearense arrima-se em Recomendação anteriormente
publicada pelo Conselho Nacional de Justiça-CNJ (nº 44, de 26 de novembro de
2013), então sob a presidência do Ministro Joaquim Barbosa.
Para além da conhecida subserviência do Poder Legislativo ao governante de
plantão, neste caso, a nosso entender, agiram corretamente os representantes do
povo ao não se pautarem pelos clamores
da população angustiada diante de tanta violência. As causas desta infeliz
situação não residem numa possível frouxidão da lei quanto a execução da pena,
consoante o equivocado discurso dos dois parlamentares contrários à propositura.
Até porque é certo ser melhor remir um apenado em poucos anos, vendo-o
resgatado para a sociedade pela leitura de bons livros, do que vê-lo cumprir
uma pena de dezenas de anos e sair mais animalizado do que quando ingressou no
ssitema penal.
A pena-retribuição que sinonimiza pena-castigo em atendimento à ânsia
vingativa de uma sociedade marcada por profundos conflitos, em nada contribui para a
recondução do apenado à sociedade, restaurando-lhe a crença no direito e na justiça.
Bem o disse um dos ícones da Ciência Penal no Brasil, o mestre Nelson Hungria,
ao buscar remissão para o seu pecado de haver contribuído para a feitura de um
Código Penal eminentemente retribucionista, ora ainda vigente no ordenamento
jurídico brasileiro. Hungria, já septuagenário, asseverava: “Mas, a lição, a
experiência dos acontecimentos do mundo atual me levaram a uma revisão de meu
pensamento, para renegar, para repudiar, de uma vez para sempre, a
pena-castigo, a pena-retribuição, que de nada vale e é de resultado ineficaz. A
pena-retributiva jamais corrigiu alguém.”
É claro que se Hungria vivo fosse, maior seria seu estremecimento diante da
situação falimentar em que se encontra o sistema carcerário brasileiro, que
agride explicitamente os mais elementares direitos humanos. O Estado, pressuroso
em punir, apresenta incompetência visceral para vencer os obstáculos que o
coloca como o verdadeiro réu da sociedade, quando ele, Estado, descuida da
obrigação constitucional e moral de prover mecanismos para a reabilitação
daqueles que delinquiram.
Eu não tenho dúvidas de que o livro é o mais eficaz instrumento de
libertação das pessoas, especialmente dos pobres. Ainda nos sertões adustos, de
onde saí para enfrentar o mundo graças aos sonhos e as esperanças que me
ofereceram os livros, aprendi uma lição inesquecível em poema de Correia
Júnior, cuja estrofe mais significativa canta a iluminação da leitura que
destrói as trevas da ignorância: “O
livro, sincero amigo,/ Tem sempre aberto um abrigo/ Que à bondade nos conduz./
É nele que a dor se cala,/ Onde apenas o saber fala/ E a treva aprende a ser
luz.”
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