Barros
Alves
Sou contra a censura prévia de
qualquer atividade cultural e artística. Isto, todavia, não significa aceitar o
abuso do direito à diversidade. Este, paradoxalmente, é o mesmo discurso daqueles
que se assentam em suas ideias e ideais para desrespeitar os valores defendidos
pelo outro. Em uma população majoritariamente cristã (católicos, evangélicos e
denominações afins), a que se somam islâmicos, testemunhas de Jeová, espíritas
etc., uma minoria intenta ditar de forma autoritária e desrespeitosa os seus
valores, moralmente condenáveis ao longo de nossa formação sociocultural.
De logo, faço minhas as palavras
do extraordinário escritor Leon Tolstói: “Tenho poucas esperanças de que os
argumentos que eu estou apresentando sobre a perversão da arte e do gosto em
nossa sociedade venham a ser aceitos ou mesmo seriamente discutidos”. E vejam
os leitores que a observação do mestre russo foi escrita em 1898, portanto, há
mais de cem anos, o que significa dizer que pervertidos sempre os temos entre
nós. Todavia, não partilho do desespero do genial romancista quando exclamou
certa feita diante dos descalabros de sua época: “É impossível viver deste modo.
Impossível, impossível, impossível!” (cf. O QUE É ARTE, Ed. Nova Fronteira, 2ª
edição, 2016, págs. 147 e 7, para as citações, respectivamente). Bem ao
contrário, urge que nos insurjamos contra a ousadia dos ignorantes, dos
pervertidos, dos depravados, dos moralmente corruptos, que intentam impingir à
sociedade o império da indecência e do despudor.
Uma polêmica ocupou a mídia nos últimos dias. A
exposição “Queermuseu - Cartografias da Diferença na Arte Brasileira”. Tão
somente uma polêmica, repito. E apresso-me em me arrimar no que escreveu o
poeta Affonso Romano de Sant’Anna em livro sobre arte. Segundo ele, “levantar
polêmica não é necessariamente um atributo estético.” (Cf. DESCONSTRUIR
DUCHAMP-ARTE NA HORA DA REVISÃO. Ed. Vieira & Lent, 2003, pág. 60). A tal
exposição instalada em Porto Alegre, com ter sido uma manifestação de evidente
mau gosto artístico, que não encanta, não enleva os sentimentos mais caros do
ser humano, muito menos eleva o espírito, constituiu, com efeito, tão-somente
uma provocação descabida e grosseira àqueles que pensam diferentemente do modo
de ver o mundo dos idealizadores desse evento que confunde arte com excremento.
Ora, a arte como uma atividade
humana que expressa esteticamente percepções, emoções e ideias do artista, com
vistas a estimular e certamente influenciar o outro, o espectador, claro está
que no caso em tela, a “arte” apresentada não passou de expressão desvestida de
beleza, isto é da virtude do belo, daquilo que desperta o sentimento do êxtase,
da admiração ou prazer pelo bom e pelo justo, posto que como dizia Santo Tomás
de Aquino, se é belo é bom e é justo. Imundície visual não tem como ser belo, a
não ser para mentes desajustadas. Para além dos relativismos deste mundo
pós-verdade, esses iconoclastas de personalidades doentias devem respeitar as
maiorias se é que pretendem o devido respeito às minorias.
A
exposição em tela, patrocinada pelo Santander com dinheiro público, via Lei
Rouanet, não foi censurada previamente. Ela foi desautorizada pela vontade
popular que se manifestou de forma firme e exerceu um princípio básico da
democracia, a liberdade de expressão e o direito de protestar. Ou esses
pseudo-artistas moralmente desqualificados pensam que só quem tem esse direito
são as minorias? Quando em conflito duas ideias ou normas positivas, claro está
que o bom senso aconselha a permanência da expressão da vontade da maioria. O
Santander compreendeu o seu equívoco e ouviu a voz dos seus clientes e da
imensa maioria dos brasileiros.
Por oportuno, lembro o logro que
tem sido algumas “obras de arte”, referido em anedota contada na citada obra de
Romano de Sant’Anna. Na parede de uma galeria estava exposto um quadro
totalmente branco. Embaixo o título da obra: “Travessia do Mar Vermelho pelos
judeus”. Alguém perguntou: “Cadê os judeus?” O autor da obra respondeu:
“Já passaram.” “E os egípcios?”, insistiu o espectador. “Ainda não chegaram”. A
piada dá bem uma ideia da ausência de “simancol” em determinados artistas. Esta
situação deprimente levou a comentários de desesperança de um dos nossos mais
importantes artistas, Nilo Firmeza, o conhecido Estrigas: “Eles, os novos
artistas, querem conseguir tudo com muita rapidez. Dentro dessa rapidez, se
esquecem de estudar, de trabalhar, de fazer autocrítica. Hoje em dia eles podem
se manter em projeção só às custas da publicidade. Assim vão os artistas de
artes plásticas. Esquecem de trabalhar a criatividade e a qualidade, para poder
chegar a ter valor.” E arremata o sempre lembrado Estrigas: “Estamos vivendo um
momento de decadência. Você não sabe mais o que é arte, então inventa isso. É uma
maneira muito cômoda de se embromar.” (Cf. Felipe Araújo, Coluna Sextante,
jornal O POVO, edição de 21/01/2006)
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