segunda-feira, 14 de setembro de 2020

REMINISCÊNCIAS DA POETISA ROSA FIRMO

 Tudo Contudo: Rosa Firmo

 Barros Alves

A escritura memorial é como um rio que corre pelos contrafortes da lembrança e atravessa a saudade imorredoura de um passado sempre presente. Nessas águas, às vezes turbulentas, serenas em momentos outros, o memorialista nada a largas braçadas e mergulha no afã de resgatar pérolas escondidas nos desvãos da memória. Esses nautas viajores que buscam nos escaninhos do tempo fatos pretéritos, são dotados da virtude do compartilhamento. Anseiam compartilhar seus devaneios e sonhares, alegrias e pesares, vivências, realizações, visões de mundo. Rosa Firmo, poetisa, historiadora, artista plástica, mestra, cuja fina sensibilidade se alteia em tudo o que escreve, constitui exemplo desse fazer literário memorial pleno do espírito de compartilhamento das suas experiências de mulher, que traz consigo desde a tenra idade o mistério da sertanidade e o entusiasmo para desvendar o mundo, tendo descoberto que o instrumento propício para plantar a amizade em sulcos de afetividade é o ato de escrever, sendo isto  para ela uma missão transcendente.

Nascida em Quitaiús, vetusto distrito de Lavras da Mangabeira, mais precisamente no Sítio Tapera, onde viveu sem inquietações os dias aprazíveis da infância, Rosa Firmo hauriu na vida campestre os eflúvios com que perfuma algumas de  suas reminiscências aqui expostas a modo de crônicas, as quais embevecem o leitor, em especial aqueles que conhecem a região e as personagens coadjuvantes no teatro onde a autora, a protagonista, desenvolve a trama de sua vida, em toda a extensão dos acontecimentos e dos esforços que iluminaram o sentido dessa mulher que venceu os embates da caminhada pela inteligência, pelo estudo e pelo conhecimento.

MERGULHO – PULSAÇÕES DE VIDA, não poderia ser título mais apropriado para epigrafar os excertos autobiográficos da autora. Carregando evidente paradoxalidade, é ao mergulhar nas águas passadas que Rosa Firmo emerge com pérolas de vida pujante e em bom estilo transmite-nos, com sobriedade e força expressionista, o quadro vivo dos gestos humanos, dos lugares e das coisas. O filósofo espanhol Ortega y Gasset afirmava que o ser humano é as suas circunstâncias. Com efeito, não é demais dizer que as circunstâncias dão força à descrição e bastam alguns traços bem circunstanciados para dar intensidade à vida referida no texto escrito. De fato, ao escrever a crônica de episódios de sua vida, relembranças de vários matizes, Rosa Firmo assegura ao leitor a possibilidade de também ele ter vivenciado circunstâncias semelhantes. E eu me vi seu colega no Ginásio São João Batista, de Cedro, nos anos finais da década de 1960, quando as turbulências estudantis na Europa – pasmem! – repercutiam por todo o mundo e também em Cedro. Já naquele tempo, na pré-adolescência, meu sangue fervia pela atividade política, enquanto a então para mim  desconhecida colega Rosa Firmo se preparava para ser a competente mestra e escritora em que se transformou.

Daquele tempo a esta parte, mil circunstâncias ditaram a trajetória pessoal e intelectual da autora, que como ser humano se notabiliza pela mansidão e paciência; no viés intelectual por assomar como figura de escol no atual cenário literário e acadêmico do Ceará. Sem favor, não devo perder a aliteração: afirmo que Rosa Firmo é firme mestra da criação literária, posto que transita pela seara da ficção poética, pela pesquisa histórico-biográfica, pela prosa relevante, sem esquecer sua posição de educadora com impagáveis serviços prestados à juventude de nosso Estado.

Ao leitor, portanto, concedo a leitura de um livro que lhe proporcionará momentos prazerosos em face de um texto que enleva pelo estilo simples e a linguagem clara e franca.

                 

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