Barros Alves
Aproxima-se o 4 de outubro com as festividades em honra de São Francisco. Eu, com prenome Francisco, sou devoto do santo homônimo. Que me presenteou com minha cara metade canindeense, inclusive. Frequentemente vou a Canindé, pelo santo e pela família dela. Mas, sempre que chego à cidade, em face das conversas e observações, às vezes me assusto e me decepciono diante dos atropelos que franciscanos moralmente desleixados e em total descompasso espiritual com a pregação do “Poverello” de Assis. Alguns, pouco ou nada contribuem para o crescimento espiritual do rebanho de fiéis e romeiros, que em profunda contrição e devoção cega passam ao largo dos desmantelos eclesiais e teológicos que têm acometido o franciscanismo de fachada, desviado do verdadeiro espírito franciscano. Vêm-me à mente desvios de outros tempos, como aquele referido pelo Barão de Studart, dando conta de que os próprios administradores dos bens de São Francisco chegaram “ao ponto de assaltar e arrombar o cofre depositado na Egreja matriz para d’elle subtrahir as quantias existentes, cometendo assim um crime e um sacrilégio”, consoante a exposição do Bispo Dom Joaquim ao proceder a intervenção na “administração dos bens de São Francisco das Chagas, padroeiro da Matriz de Canindé”, em 1º de março de 1897, que então se achava em “anormalíssimo estado.” (Cf. “Datas e Factos para a História do Ceará”, do Barão de Studart, 1924, pág. 101).
Daquele tempo a esta parte, outros desvios assomaram, entre os quais liberdades que fogem dos cânones litúrgicos e transformam a Santa Missa em verdadeiras “showmissas”; ou aqueles desvios em que se fez do púlpito palanque, em pregações de apoio desavergonhado a ações de grupos marginais como o MST, assim como a candidatos corruPTos do partido que se transformou em organização criminosa, chegando-se a vilipendiar o altar com faixas vermelhas de propaganda política; ou à formulação de convite público aos fiéis ainda contritos depois da eucaristia, para participarem de passeata política de apoio a laranja de presidiário. Por estas e outras, que dizem da pouca moral de gente que prega a santidade, quando chego em Canindé, há momentos em que tenho vontade de declamar em praça pública o soneto que o poeta português Filinto Elísio escreveu há mais de duzentos anos, mas conserva incrível atualidade:
Cristo morreu há mil e tantos anos;
foi descido da cruz, logo enterrado;
até aqui de pedir não tem cessado
para o sepulcro dele os franciscanos.
Tornou Cristo a surgir entre os humanos,
subiu da terra aos céus, lá está sentado,
inda à saúde dele sepultado
bem (o saco o paga) estes maganos.
E cuida quem lhes dá a sua esmola,
que eles a gastam em função tão pia?
Quanto vos enganais, oh gente tola!
O altar-mor com dois cotos se alumia;
e o frade com a puta que o consola,
gasta de noite o que lhe dais de dia.
Continuo a crer e a beber na fonte a pregação do santo; a dos fradecos vermelhos nem me dou ao trabalho de ouvir. Com as devidas e raríssimas exceções.

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