segunda-feira, 14 de setembro de 2020

O JOÃO DOS LEMOS

 

 

Escritor João Gonçalves de Lemos lança livro sobre suas memórias na AL

Barros Alves

             Toda família esteia-se em exemplos patriarcais, em personalidades icônicas, sobretudo do ponto de vista moral e intelectual, que lhe dão o norte e apontam para o horizonte da vida, fazendo com que pósteras gerações arrimem suas utopias e lutas nos modos de vida assentados por essas figuras basilares, as quais contribuem na formação não apenas de uma família, mas de comunidades, de povos, de nações. Não existem exemplos de mais expressividade para determinarmos a importância de um líder do que aqueles que vemos na Bíblia, onde homens e mulheres como Abraão, Moisés, Davi, Sara, Rute, Ester, Jesus e sua Mãe, revelam-se luzeiros em que civilizações inteiras se espelham para construir o futuro dos que se lhes sucedem.  Esta tradição é imorredoura, ainda que iconoclastas da cultura insistam na temeridade hedionda de querer destruir a memória desse passado e desconstruir valores assentados nos grandes modelos de homens que se alteiam pelo saber e pela conduta fundada na religião e na ética, assim também de mulheres representativas.

            Nós, como todos os demais povos da humanidade ao longo do tempo, escrevemos a nossa história pelas mãos intrépidas e escrupulosas de nossos ancestrais e daqueles que entre nós dão sua parcela de contribuição na construção do edifício familiar e comunitário.

Toda vez que vejo meu amigo e padrinho João Gonçalves de Lemos, carregando quase uma centena de anos, com sua cabeça coroada com capuchos de algodão, seu passo lento, mas firme, constato nele a força de um baobá moral e intelectual, cujas raízes estão fincadas nos nossos sertões adustos, onde foi gestado e formado para a gesta da vida aqui e alhures. Homem de muitas andanças, “globe trotter” conhecedor de outras mundivivências, João de Lemos, no entanto – eis virtude e cabedal – jamais perdeu o sentido da nordestinidade, da sertanidade, sentimentos que lhes vão nas veias, hauridos nas terras férteis do Vale do Salgado, na ribeira do Riacho do Machado, nas herdades que deram início à Fazenda Cedro; essa força e vigor lhes foram introjetados no corpo e na alma, até parecendo que João de Lemos tem um quê de imortalidade física. Imagino que foi o calor do nosso sol causticante e a força telúrica da caatinga que fez de João de Lemos esse menino irrequieto que aos 95 anos continua  dando pinote e, de fato, imortalizando-se pelas boas obras que faz e pela escritura que registra a própria trajetória nesse mundo de meu Deus, de sua família e de tantos outros com quem conviveu tanto no andar de baixo da sociedade, quanto no andar de cima, posto que ocupou elevados cargos na administração pública federal, na Universidade, e em organismos de grande relevo jurídico-social como é o caso do Instituto dos Advogados do Ceará-IAC, onde ainda exerce a presidência com descortino e proficiência ímpares.

Enfim, meu padrinho João de Lemos não precisa da louvação do afilhado, porque tem brilho para iluminar os que o circundam. É um superior exemplar de cidadão que a família Lemos legou ao Cedro, a Lavras da Mangabeira e, por extensão, ao nosso Estado e à nossa Pátria amada. Como consequência de sua formação familiar de escol, exerceu na Cidade Maravilhosa uma carreira diligente como burocrata do Estado a qual, depois de encerrada, deu lugar a uma fértil atividade intelectual, que já produziu bons frutos bibliográficos, na área dos estudos jurídicos, na literatura e na hsitoriografia. A vivência dele nas terras cariocas e seu retorno à Terra de Iracema, seu berço e abrigo, me faz lembrar a frase posta no limiar do “Memorial de Aires”, de Machado de Assis: “O mais do tempo vivi fora, em várias partes e não foi pouco. Cuidei que não acabaria de me habituar novamente a esta outra vida de cá. Pois acabei”. João de Lemos não é de lá. Nunca foi. O meu padrinho é de cá, aqui se aclimatou novamente com facilidade; neste chão seco, mas sempre milagrosamente cheio de fertilidade, a nos prover de inspiração e de alegria, a conceder imortalidade a meninos malinos como João de Lemos.

 

 

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