sexta-feira, 30 de abril de 2010

O terrorista de 1968 remunera-se em 2008




















Elio Gaspari, de O Globo
1º. de abril de 2010

Daqui a oito dias completam-se 40 anos de um episódio pouco lembrado e injustamente inconcluso. À primeira hora de 20 de março de 1968, o jovem Orlando Lovecchio Filho, 22 anos, deixou seu carro numa garagem da Avenida Paulista e tomou o caminho de casa. Uma explosão arrebentou-lhe a perna esquerda. Pegara a sobra de um atentado contra o consulado americano, praticado por terroristas da Vanguarda Popular Revolucionária. (Nem todos os militantes da VPR podem ser chamados de terroristas, mas quem punha bomba em lugar público, terrorista era).

Quarenta anos depois do atentado a bomba contra o Consulado Americano em São Paulo, Sérgio Ferro, intitulando-se "único sobrevivente" do grupo terrorista que fabricou, transportou e detonou o explosivo, informa:

1) Diógenes Oliveira e Dulce de Souza Maia não participaram dessa ação;

2) A ação foi iniciativa da ALN (Aliança Libertadora Nacional), e não da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária).

Quem disse que Diógenes, o "Luis", e Dulce de Souza Maia, a "Judith", participaram do atentado, organizado pela VPR, foi o doutor Sérgio Ferro, em seu depoimento à polícia em 29 de março de 1971. Na ocasião, Ferro estava preso e a tortura era uma política de Estado para a obtenção de confissões, verdadeiras ou falsas. Passados 37 anos, Ferro julgou oportuno corrigir seu testemunho. Em 1969, na prisão, Pedro Lobo de Oliveira e Diógenes, ambos da VPR, revelaram sua participação no atentado. Diógenes admitiu ter fabricado a bomba, com "um ou dois quilos de dinamite".

Quando Ferro incriminou Dulce de Souza Maia, sabia que ela estava a salvo, no exílio. Além disso, uma bomba a mais, uma bomba a menos, não faria muita diferença na carga que a polícia imputava à dupla mencionada por Ferro.

Diógenes e Dulce foram associados a dois retumbantes atentados terroristas. No dia 26 de junho de 1968, a VPR lançou um caminhão-bomba com 15 quilos de dinamite contra o Quartel General do II Exército, em São Paulo. Na explosão, morreu o soldado Mário Kozel Filho, de 18 anos. Dulce Maia contou sua participação nesse episódio numa entrevista a Luiz Maklouf Carvalho. Ela foi publicada no livro "Mulheres que foram à luta armada", em 1998. Diógenes nunca falou publicamente sobre o caso. Os documentos conhecidos, que devem ser vistos com reservas, são os depoimentos dele e de camaradas seus, todos presos. Diógenes admitiu ter fabricado a bomba. Onofre Pinto, que participou do atentado, disse que Diógenes acendeu o estopim.

Diógenes e Dulce também foram acusados de terem participado do planejamento e do assassinato do capitão americano Charles Chandler, em outubro de 1968. Na mesma entrevista a Maklouf, Dulce narrou sua colaboração no levantamento dos hábitos do capitão. Diógenes nunca discutiu esse atentado em público. Contudo, Pedro Lobo de Oliveira, seu colega de VPR, contou aos organizadores do livro "Esquerda armada no Brasil", premiado em Cuba em 1973, que eram três as pessoas que estavam no carro do qual partiram os assassinos do capitão: ele, que ficou ao volante, e mais dois, um com um revolver e outro com uma metralhadora. Pedro Lobo não os nomeou. Informou que a dupla só foi identificada quando um militante da VPR que "sabia quais os companheiros haviam participado" contou o caso à polícia, na prisão. Esse "delator", Hermes Camargo, tornou-se um colaborador do regime. Anos mais tarde ele repetiu os dois nomes numa entrevista a "O Estado de S. Paulo": os atiradores foram Diógenes Oliveira , o "Luis", e Marco Antonio de Carvalho, o "Marquito", morto meses depois do atentado.

Assim como deve-se dosar o crédito às confissões de Sérgio Ferro e deve-se duvidar dos depoimentos de pessoas presas, é necessário registrar que a narrativa de Diógenes, preso, é semelhante à de Pedro Lobo, solto. Diógenes reconheceu ter sido um dos autores dos disparos.

Orlando Lovecchio, que teve a perna esquerda amputada abaixo do joelho por conta da explosão da bomba que Sérgio Ferro e seus camaradas puseram no Consulado Americano, recebe R$ 570 mensais da Viúva. Os pais do soldado Mário Kozel conquistaram em 2003 uma pensão de R$ 330, reajustada no ano seguinte para R$ 1.140 mensais.

Desde o dia 24 de janeiro, Diógenes ficou em melhor situação. Ele ganhou uma Bolsa Ditadura de R$ 1. 627 mensais (as vítimas, juntas, recebem R$ 1.710), com direito a R$ 400 mil de atrasados. Repetindo há algo de errado na aritmética das indenizações e numa álgebra que acaba remunerando melhor o terrorista que participou de um atentado do que a família da sentinela assassinada ou o transeunte amputado.

2 comentários:

  1. O único e capital erro dos governantes nessa época foi acreditar que lidavam com pessoas e não essa corja imunda de ladrões, assassinos, sequestradores e demônios que mereciam somente uma coisa, execução sumária...

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