segunda-feira, 12 de setembro de 2022

O LIVRO FAKE NEWS DE JORGE AMADO

                                                                       

Barros Alves

            Jorge Amado foi comunista raiz. Elegeu-se deputado constituinte de 1947, na redemocratização empreendida depois da ditadura estadonovista. Apaixonado stalinista, era comuna militante nas lides literárias e fora delas. Laureado com os mais importantes prêmios da União Soviética destinados a valorizar mais ainda os nomes que faziam a criminosa propaganda comunista em todo o mundo, Amado foi conselheiro do grandioso Conselho Mundial da Paz, órgão máximo criado por Stalin para se apresentar ao mundo como um anjo de bondade. Metade do mundo acreditava na balela, até porque era gente como Amado, Graciliano Ramos, Neruda e tantos outros que, quais Quixotes da paz e do amor, cavalgando o Rocinante da hipocrisia, pregavam a mentira mundo afora. Claro que isso não era feito apenas pelos belos olhos de Stalin ou dos escritores amestrados pela ideologia do “homo sovieticus”, para lembrar a escritora ucraniana Svetlana Alecsiévitch, Prêmio Nobel de Literatura de 2015, autora do livro “O Fim do Homem Soviético”. Jorge Amado ganhou muito dinheiro com essa tenebrosa brincadeira, pois seus livros propagandeados pelos colegas comunistas, tiveram traduções em mais de uma centena de línguas e dialetos no planeta. No Brasil, best seller. Não foi agraciado com o Prêmio Nobel porque quando aventou essa possibilidade, já estava em rota de colisão com os caudatários do sistema soviético, cujos tentáculos marxistas ainda hoje determinam quem recebe certas premiações internacionais, uma vez que as instituições agraciadoras estão todas aparelhadas por comunistas agora disfarçados com outras vestimentas ideológicas como, por exemplo, defensores do meio ambiente, da ideologia de gênero etc.

Claro que Jorge amado se tornou respeitado entre os seus pares não apenas por ser comunista, tem um inquestionável talento para inventar e contar história. Eu o leio e releio com prazer desde a adolescência. Dele guardo breves bilhetes cheios de gentileza. Era um homem generoso. Mas, o fato é que mordido pela ideologia marxista, teve o seu período de estúpida atuação como ficcionista e como político. Felizmente, acordou do pesadelo e fez “mea culpa”, proibindo a reedição do livro fake news que consta de sua bibliografia, intitulado “O Mundo da Paz”, um rosário de elogios ao stalinismo e ao sistema soviético. Uma obra encomendada, bajuladora, panfletária no sentido dos exageros que o autor perpetra ao tentar apresentar um inferno com jeito de paraíso. Para se ter uma ideia da heresia político-ideológica, basta dizer que tem um capítulo no referido intitulado “A Albânia, uma festa”. A Albânia foi a experiência comunista mais asquerosa e nojenta da história dos crimes seqüenciados na esteira da Revolução de 1917 da URSS, porque a mais cruel para o povo. O comunismo albanês assassinou mais de dois milhões de compatriotas, configurando o pior regime de terror fundado no marxismo. Certamente, envergonhado por ter sido advogado desse desastre moral pior do que o nazismo, – Jorge Amado não esconde seu erro –, é que ele  defenestrou “O Mundo da Paz” de todas as edições de sua pujante “Obra Completa”. Esse livro que teve uma única edição é hoje raríssimo, e me caiu nas mãos por obra e graça do Espírito Santo. Por outro lado, seria ingenuidade pensar que o nosso amado baiano não sabia o que ocorria nos escaninhos do governo soviético, onde uma cúpula ditatorial usava e abusava do poder, cometendo crimes atrozes como o Holodomor, matança planejada pela fome de cerca de cinco milhões de ucranianos, com o objetivo de dobrar a cerviz daquele povo.

Todavia, há que se perdoar o homem político Jorge Amado, porque ele lamentou seu tempo de stalinista durante os anos posteriores ao rompimento com aquele mundo de farsa, de engodo, de ludíbrio, de enganação e de crime, e fez sincera autocrítica em muitas entrevistas concedidas para meios de comunicação de todo o mundo. Sem esquecer que ele foi perseguido pelo “staf” literário do campo socialista, que antes o endeusava. Dele disseram o diabo, atacaram o homem e a obra, afirmaram que ele não sobreviveria como escritor. Erraram todos os seus críticos de ocasião. Jorge Amado não apenas permaneceu inspirado, fértil e produtivo escritor, como viu seus livros serem reeditados muitas vezes pelas melhores editoras de vários países. Infelizmente, nesses dias grávidos de comunicação virtual, de Wattsap, Telegram, de Instagram, de Twitter e tantas outras possibilidades comunicacionais, a leitura de livros impressos se junge àqueles que a própria mídia eletrônica orienta e que não são lá coisa que se possa  chamar de literatura com mínima qualidade estética, salvo raras exceções. Duvido, porém, que alguém que vier a ler um “A Morte e a Morte de Quincas Berro d’Água”, um “Pastores da Noite”, um “ABC de Castro Alves”, um “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, um “Gabriela, Cravo e Canela”, não se encante pela ficção romanesca de Jorge Amado. Ainda bem que não temos mais editado o escabroso “O Mundo da Paz”, porque sempre tem alguém disposto a aceitar excremento como literatura.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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