Nos últimos anos, Frei Clodovis Boff, que se notabilizou como um dos expoentes da Teologia da Libertação, consolidou-se como uma das vozes mais coerentes e espiritualmente lúcidas dentro da Igreja Católica contemporânea. Clodovis é irmão do ex-frade Leonardo Boff, este totalmente desviado da fé católica e atolado no fétido pântano da herética Teologia da Libertação. Aliás, segundo o Papa Bento XVI, um dos grandes teólogos da Igreja Católica na contemporaneidade, a TdL nem deve ser chamada de teologia, mas de sociologia. Felizmente, a partir dos anos 1990, a lucidez de Frei Clodovis Boff fê-lo reconsiderar muitos pontos teológicos por ele defendidos e iniciar um processo de afastamento do cenário teológico que de libertador nada tem. Esse novo olhar sobre a Teologia que pretendia ser de libertação, mas degringolou, culminou com o rompimento total em 2007, quando publicou contundente ensaio na Revista Eclesiástica Brasileira (REB, n⁰ 268, out/dez, 2007), no qual critica a "inversão metodológica" da TdL. Recentemente, agora octogenário, Clodovis Boff, um intelectual no sentido lato do termo e um teólogo de escrita bem mais profunda do que o vôo de galinha de Leonardo, publicou três livros que surgem como o coroamento do abandono do monstrengo em que se transformou TdL. A trilogia é formada pelas obras “A Crise da Igreja Católica e a Teologia da Libertação”, “A Igreja em Subida” e “Por uma Teologia com o Perfume de Cristo”. Esses livros compõem um "corpus" de pensamento que busca restaurar a centralidade de Cristo e devolver à teologia católica o seu perfume original: o da fé, da oração e da santidade.
“A Crise da Igreja e a Teologia da Libertação" é o primeiro livro da trilogia denominada “O Livro do Sentido”, obras organizadas pelo Padre Leandro Rasera. Neste livro consta o debate inicial de 2007/2008, acrescido de um novo ensaio em que Clodovis, conforme bem dito por Rasera, “não titubeia em desmascarar algumas incongruências eclesiais recentes e (...) desata os nós deste ‘denso nevoeiro mental’ que ainda resistem por desfazer-se.” A obra constitui uma espécie de prefácio doutrinário e espiritual para o caminho que Frei Clodovis percorreria nos anos seguintes. Nele, o autor apresenta um diagnóstico severo: a Igreja contemporânea atravessa uma crise não apenas pastoral ou moral, mas teológica. Ele observa que parte da teologia latino-americana, ao pretender libertar os oprimidos, acabou prisioneira de esquemas ideológicos. A opção preferencial pelos pobres, legítima porque tem raízes no Evangelho, foi transformada por alguns teólogos em princípio teórico absoluto, deslocando Cristo do centro da fé. O resultado, segundo Clodovis, foi uma teologia nivelada por baixo, horizontal, que substituiu a contemplação por militância político-ideológica marxistizada; a oração por sociologia; e a transcendência por luta de classes. Nesse livro, o autor ainda fala com a dor de quem viveu por dentro essa experiência. Longe de negar a preocupação social do Evangelho, ele insiste que toda ação libertadora só é verdadeiramente cristã quando nasce da comunhão com Deus. Assim, “A Crise da Igreja e a Teologia da Libertação” é tanto uma crítica quanto um apelo: que a Igreja volte ao leito da espiritualidade cristã, onde a caridade é inseparável da fé e a missão nasce da adoração.
“Por uma Igreja em Subida - a espiritualidade como resposta para a crise da Igreja”, é o segundo livro dessa jornada em que frei Clodovis Boff se apresenta como aquele que deseja o retorno do Catolicismo aos trilhos da Boa Nova do Cristo. Ele convida os cristãos a “subirem novamente ao monte”, imagem que evoca a transfiguração e a intimidade com o Senhor. “Sursum corda!”, como dizemos na Santa Missa. A “subida” é tanto espiritual quanto eclesial. Trata-se de devolver à Igreja o sentido de Deus, perdido nas disputas ideológicas e na rotina pastoral. O teólogo insiste que não há reforma verdadeira sem conversão interior. Subir é abandonar o chão raso do ativismo para reencontrar o olhar contemplativo da fé. É o chamado à oração, à adoração e à redescoberta do sagrado. É o contrário da pregação do Papa Francisco, que estimulou a militância de uma “Igreja em saída”. Um desastre! Os católicos decepcionados com a ausência do olhar para o Alto, começaram a saída para irem abrigar-se em denominações protestantes/evangélicas.
O terceiro volume da trilogia em pauta, traz título poético: “Por uma Teologia com o Perfume de Cristo”. Nesse livro, Frei Clodovis atinge o cume de sua reflexão. O tom é mais espiritual e confessional. A metáfora do “perfume de Cristo”, retirada da segunda carta que o apóstolo São Paulo escreveu aos coríntios (2.15), exprime o desejo de recuperar a beleza e o encanto da fé cristã, que se esvai quando a Igreja se reduz a uma ONG ou a um partido político a impingir às pessoas, ideologias estranhas ao sentido cristão da vida de cada um e da convivência em sociedade. Clodovis Boff recorda que a teologia deve ser antes de tudo contemplação do Mistério. Uma teologia sem Cristo é teologia sem alma. Por isso, ele propõe uma “purificação teológica”, voltada à centralidade no Cristo e à experiência do Espírito Santo como fonte da missão e da caridade.
A leitura conjunta desses livros revela o movimento interior de um teólogo que buscou unir fidelidade e renovação. Clodovis Boff não se coloca como juiz da história, mas como testemunha de um retorno à centralidade do Cristo na nossa individualidade, na comunidade eclesial e na humanidade. Sua obra representa um esforço de reconciliação entre a dimensão social e a dimensão espiritual da fé. Ele não abandona os pobres, mas os devolve a Cristo. Não renega a história, mas a ilumina a partir da eternidade. Num tempo em que a Igreja parece dividida entre o clericalismo e o ativismo, entre a política e o espiritualismo, Frei Clodovis Boff aponta um caminho de síntese: o da teologia feita de joelhos, com o coração impregnado do perfume de Cristo.
A obra resultante das reflexões penitenciais de Frei Clodovis Boff constitui uma das mais significativas contribuições teológicas das últimas décadas. Ela combina lucidez intelectual, fidelidade e profunda vida espiritual. Mais do que um debate de ideias, é um testemunho de fé. Com humildade e sabedoria que vem do Alto, ele convida os católicos a reencontrarem a seiva do cristianismo autêntico: a comunhão com Cristo vivo. Somente uma Igreja que ora, adora e ama poderá novamente evangelizar o mundo. Sem o perfume de Cristo, repete ele, “toda teologia fede a ideologia; com Ele, a Igreja exala o bom odor de Deus”.
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