quarta-feira, 19 de maio de 2010

Meus livros, meus amores






Quando eu pouco tinha a fazer a não ser perambular pelo centro de Fortaleza, quase todos os dias fazia ponto na Academia Cearense de Letras,cujo presidente na época era o saudoso professor e poeta Cláudio Martins. Ia beber a sabedoria dos acadêmicos que por lá apareciam. Diariamente lá estavam entre outros o Dr. Cláudio, Valdivino de Carvalho, Luís Sucupira, Antônio Girão Barroso e Mozart Soriano Aderaldo. Com este eu me metia a besta de discutir política e religião. Ora, Mozart havia sido aluno de ninguém menos do que Gustavo Corção, um dos grandes pensadores católicos do Brasil, e era uma das inteligências mais lúcidas do Ceará. Naquele tempo, limiar dos anos 80 do século passado, eu andava enfronhado com os comunistas e pensava mudar o mundo. Mozart me dava lições que eu renegava e só tempos depois é que fui conceder-lhe todas as razões que de fato tinha.

Mas, havia também a professora Conceição Sousa. Ela foi uma das fundadoras do Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Ceará e por muitos anos secretária da Academia Cearense de Letras, além de guardiã da rica biblioteca daquele sodalício. Passávamos horas e horas conversando. Ela falava dos seus sonhos e dos passados encantamentos. Chegou a confidenciar-me sobre o amor que dedicou ao professor Dolor Barreira, mestre do Direito e autor da monumental História da Literatura Cearense. Amor que não ultrapassou os limites do platônico, claro. Dolor era homem comprometido.

Certa feita - lembro-me como se fosse hoje - a Conceição me admoestou: - "Olhe, meu filho, jamais empreste um livro. Livro é igual a mulher, cheio de ciúmes e nós pelas costas. Se você os ama trate-os como o faz com sua mulher. Você emprestaria a sua mulher? Se você empresta o livro ele se sente rejeitado e não volta mais para você".

Eu não atentei para a importância e veracidade do conselho. Resultado: grande parte dos livros que emprestei não mais retornaram ao meu convívio. E eu continuo morrendo de saudade deles. Não consigo curar a fossa de havê-los abandonado em mãos por vezes iconoclastas. Como tinha razão a Conceição!!!

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